No Brasil existe uma enorme adoração pela ciência esportiva, como se a verdade fosse única, como se o futebol não fosse um jogo de tantas incertezas. Repito, o conhecimento vai muito além da informação, e a sabedoria vai muito além do conhecimento.
O que diria a inteligência artificial após receber milhares de informações técnicas e táticas, antes e durante as partidas entre Flamengo e Vasco e entre Flamengo e Botafogo? Ela teria a mesma impressão dos comentaristas? Será que a inteligência artificial perceberia os detalhes emocionais e subjetivos de um jogo de futebol?
Uma coisa é certa. As opiniões da inteligência artificial não teriam erros gramaticais nem seriam influenciadas pelas oscilações de humor dos analistas.
Será que a inteligência artificial entenderia os chavões, os lugares-comuns e as terminologias usadas por técnicos e comentaristas de futebol, como “os extremos desestruturantes” citados por Tite quando ele se referia aos pontas dribladores e velozes? Será que a inteligência artificial compreenderia palavras e expressões como último terço do campo, lateral construtor, marcação alta, baixa e tantas outras?
As pessoas estão, progressivamente, mais dependentes da tecnologia e do celular. Desconfio que eu não tenha o gene da informática. Se não fosse a ajuda de pessoas próximas e queridas, seria expulso do planeta. Apesar da minha genética e da minha preguiça mental, sei a enorme importância que a tecnologia trouxe para a ciência, para o desenvolvimento pessoal e da sociedade, além de ser uma ótima distração, desde que não se transforme em um vício, uma compulsão, o que é hoje frequente.
A tecnologia faz o ser humano mais feliz? Penso que não. Por outro lado, ela não tem nada a ver com a angústia existencial do ser humano. A dependência da tecnologia é uma realidade sem volta. O ruim é a ansiedade do ser humano em querer se identificar com a máquina, incorporá-la, como se ela fizesse parte do corpo e da mente. É o que acontece quando alguém cria um personagem e os dois passam a ser a mesma pessoa.
A ciência não explica tudo, o que deixa o ser humano desamparado diante dos mistérios, dos perigos e da finitude da vida. Em um momento do filme “Zorba, o Grego”, Zorba, um homem rude e apaixonado pela vida, pergunta ao seu patrão, um homem culto e triste, o que os livros (hoje seria o Google) falam sobre a vida após a morte? O patrão responde: “Os livros não têm resposta”. Zorba retruca: “Então, seus livros não servem para nada”.