Importação cresce e indústria corre ao governo por proteção comercial

As importações alcançaram participação inédita no mercado da indústria em, pelo menos, 20 anos e provocaram uma corrida das empresas ao governo por medidas de defesa comercial. Desde o ano passado, 60 pedidos chegaram ao Departamento de Defesa Comercial (Decom), a porta de entrada desses processos na Secretaria de Comércio Exterior (Secex).

As petições têm como objetivo a abertura de investigações sobre práticas desleais de comércio ou a prorrogação de medidas, que têm prazos de vigência determinados, contra concorrentes do exterior. Quando essas investigações terminam com a conclusão de que um produto está entrando no Brasil com preços abaixo do normal, o que caracteriza um dumping, ou com subsídios sujeitos a medidas compensatórias, o governo aplica uma tarifa extra para proteger a produção nacional.

Só em 2023, 42 petições foram protocoladas, interrompendo quatro anos seguidos de queda no fluxo. No mês passado, outras 18 chegaram ao Decom, num sinal de que uma nova onda de pedidos de defesa comercial pode estar se formando. “Pelo número que já temos, sabemos que teremos bastante trabalho”, diz a secretária de Comércio Exterior, Tatiana Prazeres.

Por se tratar de informação confidencial, não é possível saber quais são os alvos desses pedidos. Porém, pelas investigações concluídas no ano passado, onde esse dado é aberto, e também pelas manifestações públicas vindas da indústria, nota-se um grande incômodo com os produtos chineses.

Dos 24 processos encerrados no ano passado, nem sempre com resultados favoráveis a seus peticionários, nove – ou seja, mais de um terço – tiveram a China como origem investigada. As investigações tiveram como desfecho a manutenção de direitos antidumping sobre sete produtos chineses: vidros automotivos, pneus agrícolas, malhas de viscose, fios de aço, cordoalhas de aço, tubos de aço sem costura e ácido cítrico. Outras duas, sobre subsídios e dumping de cabos de fibra óptica da China, terminaram sem análise de mérito.

Com a recuperação decepcionante do consumo interno após as rígidas políticas de controle da pandemia, mais as restrições nos principais destinos de suas exportações, por causa da substituição dos produtos chineses e do impacto dos juros altos nas economias desenvolvidas, a China está deslocando a sua produção, a preços mais baixos, ao resto do mundo. O calçado chinês, por exemplo, entrou no Brasil durante o ano passado a um preço médio, em dólares, 12% inferior ao valor de antes da pandemia. O dado é da Abicalçados, a associação que representa a indústria nacional de calçados.

A partir de ações não só no governo, mas também na Justiça, a indústria brasileira busca, assim, fechar portas. “Você vende onde pode. O mercado americano tem ficado mais restrito, porque as empresas estão fazendonearshoring (aproximando as bases de fornecimento) e também colocando mais capacidade em países como Índia e Vietnã. Não querem ficar com uma dependência concentrada na China e expostas a decisões do governo chinês”, comenta o ex-diretor do Banco Central Tony Volpon.

Em paralelo, dada a tendência de a guerra comercial ficar mais quente com a proximidade das eleições nos Estados Unidos, onde as pesquisas são hoje favoráveis a Donald Trump, a indústria chinesa também não quer ficar exposta a barreiras americanas e busca diversificar seus mercados. “A tendência é de aumentar as restrições comerciais, não diminuir”, diz Volpon, que hoje é professor adjunto da Georgetown University, em Washington.

 

Fonte: O Estado de São Paulo

 

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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