Grupo varre a internet à caça de racismo e preconceito contra domésticas

A jovem C. A., de Uberlândia (MG), usou as redes sociais para compartilhar uma piada com os amigos. Em tom de charada, postou na sua conta no Twitter: “Sabe quanto tempo uma empregada negra demora para colocar o lixo pra fora?”. A resposta dada por ela própria assusta: “nove meses”. Criticada por parte dos internautas que se depararam com o tweet, rebateu: “Isso é só uma piadinha, acalme se (sic)”. Em seguida, acrescentou que não está preocupada em ser denunciada por racismo: “Eu respondo pelas minhas atitudes baby”.

As afirmações de C. estão entre os tweets reunidos por uma comunidade criada no Facebook e no Twitter para denunciar casos de preconceito contra empregadas domésticas na rede. Sob o título A Minha Empregada, o grupo tem 17 mil seguidores no Twitter e 2 mil no Facebook. A descrição da página é objetiva: “Chibatada é serventia da casa (contém ironia e tristeza na batalha contra a imbecilidade e o preconceito”. O iG tentou contato com os organizadores da comunidade, mas não teve retorno.

A imensa maioria das mensagens denunciadas contém xingamentos como “puta”, “trouxa”, “gorda”, “fedida”, “desgraçada” e “favelada”. É recorrente a torcida para que as empregadas “morram”. Com um coraçãozinho no lugar de seu nome no Twitter, uma das pessoas dispara: “a vadia da minha empregada quebrou o meu óculos, FDP tomara que morra”. Outra jovem, J.,  engata: “minha empregada é uma folgada, abusada, que não me respeita e deveria morrer! ARGH !!!!!!!”.

Após serem procuradas pelo iG, apenas J. respondeu o contato, mas se recusou a conversar com a reportagem. “kkkk mamãe me ensinou a não conversar com estranhos moça”, explicou, após escrever “KKKK F… PESSOAL É HOJE QUE ENTRO EM CANA”.

Informada pela reportagem do iG sobre a página, a procuradora Lisyane Chaves Motta, coordenadora nacional de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação do Trabalho, diz que o Ministério Público do Trabalho tomará providências quanto ao assunto. Ela descreve como “repugnante” a postura de C. e de outros internautas e compara o comportamento ao bullying praticado nas escolas. “É um retrocesso muito grande usar a internet, uma ferramenta tão importante, para destilar preconceitos. Não importa se é criança, adolescente. Está errado e tem que ser reprimido desde pequenininho. É preciso aprender a respeitar a diversidade desde cedo”, defende.

Segundo ela, o material tem de ser retirado do ar. “Existem casos de comentários ofensivos em que o provedor do site é responsabilizado por aquele conteúdo e se entra com uma ação civil. Eu já vi casos no Ministério Público Estadual, no Ministério Público Federal, mas nós não tivemos ainda um caso na área do Trabalho. É a primeira vez que eu vejo uma denúncia relacionada com a questão de ofensa a trabalhadores na internet – já que a doméstica é uma trabalhadora, embora a própria demora do Congresso Nacional em regulamentar seus direitos seja mais um exemplo da resistência social em se reconhecê-las assim”, diz Lisyane.

Ao ver o post de C., a deputada federal e ex-empregada doméstica Benedita da Silva (PT-RJ) se emocionou. “Essa pessoa não vê ainda uma empregada, principalmente uma empregada negra, como uma pessoa, como gente igual a ela. Sendo que essa empregada é necessária para limpar a sujeira que ela mesma fez, pra cuidar, para fazer a comida, levar a criança no parque, acordar de manhã com carinho”, criticou, em meio a lágrimas. “Dizem que nós negros somos sujos, mas nós negros sempre trabalhamos para limpar a sujeira dos outros”, prosseguiu a ex-governadora do Rio de Janeiro.

 

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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