Dilma ensaia retorno à receita de FHC
Com a inflação ameaçando sair do controle e a popularidade em queda, a presidente Dilma Rousseff vem promovendo uma mudança na sua política econômica ao elevar os juros e soltar as amarras da taxa de câmbio.
Economistas renomados avaliam que o governo vem sendo obrigado a adotar, parcialmente, a receita que garantiu a estabilidade de preços nos governos FHC e Lula.
Com exceção do controle de gastos públicos, pouco a pouco o governo retoma as outras duas bases do tripé econômico: metas de inflação e câmbio flutuante.
“O Banco Central resolveu se mexer e isso representa um reforço ao tripé”, disse à Folha o ex-presidente do BC, Armínio Fraga, que instalou o sistema de metas de inflação no Brasil em 1999.
Nas duas últimas semanas, o BC apertou o ritmo de elevação da taxa básica de juros e o governo baixou impostos para atrair investidores estrangeiros em renda fixa. Dilma frisou publicamente que “o câmbio é flutuante”.
O discurso marca uma diferença em relação ao que vinha sendo praticado até então. O governo havia flexibilizado o tripé em direção ao que chamou de “nova matriz econômica”: juros baixos, câmbio forçadamente desvalorizado e desonerações.
NECESSIDADE
Para economistas, as mudanças promovidas pelo governo não estão sendo feitas por convicção, mas por necessidade, por conta do aumento dos preços e do movimento global de apreciação do dólar.
“Está começando a pegar fogo na sala, então jogam um balde de água”, diz Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC. A inflação acumulada em 12 meses até abril está em 6,5% -teto da meta do BC.
Pastore avalia que a política econômica de Dilma não gerou crescimento e, sim, inflação. “O governo ficou preso num dilema: crescimento baixo e inflação alta.”
Apesar dos sinais de mudança, o mercado financeiro ainda não está convencido de que é para valer, por conta da resistência do governo em controlar seus gastos.
Sem reduzir as despesas públicas é mais difícil conter a inflação e o BC tem que elevar ainda mais os juros. Há uma descrença no mercado de que o governo está disposto a subir a taxa o suficiente para trazer a inflação de volta para a meta (4,5%).
Na quinta-feira à noite, a S&P ameaçou rebaixar a classificação do Brasil, citando a “perda de credibilidade” da política econômica.
Segundo a Folha apurou, a avaliação no Ministério da Fazenda é que a política fiscal “já é austera, anticíclica e vai continuar sendo”.
Para Armínio Fraga, o tripé econômico não tinha sido abandonado, mas “flexibilizado”. “A inflação foi saindo de controle e o governo respondeu com medidas pontuais, que mascaram o problema. Agora o BC agiu.”
Para ele, o mercado teve a impressão que o dólar estava “tabelado” em torno de R$ 2, mas isso foi “desmentido pelos fatos”. “O que me preocupa é que a política fiscal segue expansionista e isso prejudica o trabalho do BC”.
Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da Unicamp e conselheiro da presidente Dilma, concorda que o governo está economizando menos.
Mas, para ele, isso é resultado da menor arrecadação, provocada pela fraqueza da economia, e das reduções de impostos para recuperar o crescimento.
“O BC está elevando os juros porque o ajuste fiscal é mais difícil. E isso é o preço que pagamos pelo desarranjo do passado”, afirma, referindo-se aos efeitos da valorização do dólar por anos sobre a indústria brasileira.
CRÍTICAS
Para o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, o governo está aproveitando o momento de alta global do dólar, provocado pela recuperação da economia americana, e permitindo minidesvalorizações do real.
“Há uma pressão de depreciação no mercado, devido ao deficit comercial e à redução de entrada de capital, e o governo deixou o dólar chegar a R$ 2,15”, disse Bresser.
O ex-ministro tem críticas ao tripé macroeconômico. Segundo ele, nesse regime, o dólar barato foi o principal instrumento contra a inflação. Tampouco prevê como exitosa a estratégia de Dilma:
“Com essa política, não vamos retomar o crescimento, porque a taxa de câmbio continua apreciada.”
Fonte: Folha de São Paulo