Varejo e indústria descolam de pessimismo dos bancos
Com a perspectiva de ganhos no curto prazo, o mercado financeiro tem sido pouco otimista em relação a economia brasileira. Já a indústria e o varejo dão sinais de que esperam um 2014 melhor do que os bancos.
Para Júlio Cesar Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, a menos que a indústria encolha, ou seja, apresente crescimento negativo, não haverá Produto Interno Bruto (PIB) menor que 2% para este ano. “O mercado financeiro tende a ser mais pessimista mesmo, isso é natural”, pontua.
“Tem pessimista demais no mercado dizendo que as coisas vão muito mal, mas todos as questões delicadas da nossa economia como a inflação e os juros são equacionáveis”, aponta Percival Maricato, diretor da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel). O setor – que espera ganhar mercado com a Copa do Mundo – opera sobre uma expectativa de 2% a 2,5% de crescimento econômico. “O País ainda está saudável, há outros que produzem riqueza além do setor produtivo.”
Segundo dados mais recentes do Boletim Focus (que coleta semanalmene as expectativas para os principais índices da economia junto as maiores instituições financeiras no País), divulgados na segunda-feira (19), o PIB em 2014 deve crescer 1,69% e a inflação deve apresentar uma alta de 6,43%.
Tanto entre os setores produtivos quanto no varejo, a expectativa é sim de um ano difícil, mas com um crescimento um pouco maior do que esse que as instituições financeiras vêm mostrando. Em média, a expectativa é de um PIB de 2%, 0,3 ponto percentual maior que o estabelecido pelos bancos.
Para se ter uma ideia de quanto 0,3 ponto percentual representa no PIB, no ano passado esse valor foi equivalente a R$ 14,52 bilhões do total do PIB do País. O valor é um pouco menor que o lucro do Itaú, maior banco da América Latina, em 2013, que foi de R$ 15,7 bilhões.
Motivo
O posicionamento pessimista do setor financeiro não é o prelúdio de um apocalipse, mas um indicativo claro de um mau humor bastante peculiar a este setor. Mau humor este que, por sinal, é esperado e tem uma justa razão. “Precisamos lembrar que instituições financeiras operam com um nível de alavancagem alto e que qualquer erro acaba gerando um efeito multiplicador”, comenta Fabio Pina, assessor econômico da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP). “Além disso, não podemos esquecer que um desempenho menor que a expectativa impacta nos bônus e salários dos principais decisores.”
Na Fecomércio, por exemplo, a estimativa é de um PIB com crescimento de 2% neste ano – isso porque para o setor, a expectativa é de um avanço de 4% no resultado. “Nós já não estamos esperando um crescimento fantástico mesmo”, completa Pina. “Nós acompanhamos essas expectativas do mercado financeiro, mas é natural que sejam mais pessimistas que nós.”
Luis Augusto Ildefonso da Silva, diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), também estima 2% de crescimento para a economia nacional, mas garante que o setor terá resultado “seguramente mais polpudo” que o PIB. “Temos vários movimentos que podem atrapalhar o varejo, então estamos mais conservadores”, comenta Silva. “A propensão a comprar diminuiu, o próprio consumidor está com receio de pôr a mão no bolso.” E, mesmo assim, sua projeção é mais otimista que a dos analistas consultados pelo Banco Central.
“Há um pessimismo excessivo quanto à economia nacional”
Mesmo no setor produtivo, onde os prognósticos não são dos melhores, há quem ache excessivo esse cenário de terror. Luiz Moan, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), lembra que o mesmo clima permeava 2013. “Há um pessimismo excessivo quanto à economia nacional”, disse em entrevista coletiva no começo de maio. Para este ano, Moan – que já trabalhava expectativa em torno dos 2,3% para o ano passado, mesmo com o pessimismo geral – espera um crescimento em torno dos 2%.
Ano está difícil de prever
Não dá para negar, no entanto, que está bem difícil de fazer previsões para 2014. “O ano é totalmente atípico”, sinaliza Otto Nogami, gestor de fundos de investimento e professor do Insper. Copa do Mundo e eleições colocam a economia em ritmo de espera e o clima é pura incerteza. Tudo isso, atrapalha – e muito – a previsibilidade da economia nacional. “Está um clima estranho no ar, sem dinamismo.”
Nogami entende que setores normalmente apoiados pelo governo – como o automotivo – tendem a ser mais otimistas. “Existe uma expectativa grande que o governo vá dar suporte à indústria automotiva. Ninguém quer coordenar um País com desemprego”, sinaliza.
No entanto, Nogami ressalta que esse compasso de espera tende a alimentar o mal estar generalizado e, com isso, mantém o clima geral de insatisfação. “O setor financeiro pode estar antecipando alguns fenômenos contrários ao crescimento da economia”, aponta o especialista, que espera um PIB 1,4% maior neste ano.
Fonte: iG