Temer aprova projeto e Justiça Militar passa a julgar crimes contra civis

O “Diário Oficial” da União divulgou nesta segunda-feira (16) que o presidente Michel Temer sancionou o projeto de lei enviado pelo Congresso que transfere para a Justiça Militar o julgamento de crimes dolosos contra a vida praticados contra civis por militares quando em atividade operacional, como nas missões do tipo GLO (garantia da lei e da ordem), a exemplo das realizadas atualmente em comunidades de morros do Rio de Janeiro. A lei passa a vigorar de imediato.

A transferência dos julgamentos, que a partir de uma lei de 1996 eram realizados por tribunais de júri da Justiça comum, é alvo de críticas de organizações não governamentais e do MPF (Ministério Público Federal).

Para a Anistia, as Forças Armadas já demonstraram no passado recente que não prezam pela apuração rigorosa de crimes em suas fileiras. Inúmeros casos de torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados de opositores à ditadura militar (1964-1985) até o momento permanecem impunes nas Forças Armadas.

Em nota técnica encaminhada ao Congresso ainda na gestão de Rodrigo Janot, a PGR (Procuradoria Geral da República) argumentou que a Justiça Militar não tem independência funcional em relação às Forças Armadas e, por isso, não teria a isenção necessária para processar e julgar as acusações contra militares.

O ministro da Defesa, Raul Jungmann, disse à Folha que a mesma PGR já se manifestou favorável à transferência, segundo ele, durante um processo que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal). O ministro afirma que não é possível comparar a época da ditadura militar com a atual democracia.

O projeto de lei oriundo da Câmara dos Deputados e aprovado pelo Senado, com relatoria do senador Pedro Chaves (MS), do partido conservador PSC, presidido por um pastor evangélico, é apoiado pelo STM (Superior Tribunal Militar), o MPM (Ministério Público Militar) e as Forças Armadas.

STM e MPM dizem que têm isenção e independência para julgar os casos. O Exército argumenta que haverá maior celeridade nos processos.

Segundo o texto sancionado por Michel Temer, os crimes dolosos contra a vida de civis passarão a ser julgados pela Justiça Militar desde que realizados “no contexto” do “cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo presidente da República ou pelo ministro da Defesa”, na “ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar, mesmo que não beligerante” e na “atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da ordem ou de atribuição subsidiária”, realizada em conformidade com a Constituição.

Segundo a lei, crimes contra a vida cometidos por militares contra civis fora dessas circunstâncias, ou seja, quando o militar não estiver em serviço, continuarão sendo julgados pelos tribunais do júri da Justiça comum.

Em nota nesta segunda-feira (16), o Ministério da Defesa acrescentou que “o tribunal do júri não se afigura como o foro mais adequado para julgar um ato praticado por um militar das Forças Armadas no exercício de operação militares” por dois motivos, entre os quais, “o militar das Forças Armadas não está agindo como cidadão, mas sim com o próprio Estado, na sua força máxima, devendo ser julgado por justiça especializada”.

Segundo a pasta, o processo em Justiça comum “pode prejudicar definitivamente a carreira do militar, seja pela demora no julgamento, seja pelo risco jurídico de não compreensão das peculiaridades de sua atividade e de seus atos no exercício da missão militar”.

O ministério disse ainda que a nova lei “vem corrigir algumas distorções e incongruências jurídicas atualmente existentes” e que o projeto aprovado no Congresso “não [se] trata de foro privilegiado, mas sim de definição de competência de justiça especializada constitucionalmente prevista”.

O Ministério da Defesa não apresentou publicamente os números de militares envolvidos em casos de crimes dolosos contra a vida de civis em operações militares, mas afirma que são casos raros.

Em 2008, um grupo de militares do Exército, sob comando de um tenente, entregou três jovens do Morro da Providência a traficantes da Mineira, no Rio de Janeiro. Eles foram espancados e assassinados com vários tiros.

Em 2015, o estoquista e músico Vítor Santiago Borges teve a perna esquerda amputada depois que seu carro foi alvejado por tiros de fuzil disparados por militares do Exército no conjunto de favelas da Maré, também no Rio. 

 

Fonte: Folha de São Paulo

 

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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