Restaurantes franceses importam carne de melhor qualidade do Brasil
É fácil gastar uma fortuna na França em um simples pedaço de carne.
Quase todos os bistrôs de Paris oferecem bavette com chalotas, faux-filet com batatas fritas, alcatra com molho roquefort. Os cardápios costumam identificar as raças nobres que são fontes desses cortes; mais notavelmente, o charolês branco, o limousine marrom e o blonde d’aquitaine de pelagem de cor de trigo.
O problema é que grande parte da carne bovina originária da França não é maravilhosa. Por isso, nos últimos anos, uma revolução silenciosa tem acontecido. A carne estrangeira — dos Estados Unidos, da América do Sul ou de outros países europeus — está invadindo o país.
“Na França, nós temos raças grandes, poderosas e musculosas de bovinos que foram criadas para trabalhar”, afirma Yves-Marie Le Bourdonnec, açougueiro há 30 anos. “Infelizmente, elas produzem uma carne com muito pouco sabor.”
Le Bourdonnec é uma verdadeira estrela. (Ele posou nu com um côte de boeuf para um calendário de 2012, a fim de emprestar um “toque sexy” à sua profissão). Ele também é defensor da importação de carne.
Se há um açougue que pode ser considerado um museu, é o seu Boucherie Lamartine, com sua fachada clássica, azulejos e trabalhos em madeira esculpida à mão. O título “especialista em maturação” aparece escrito em ouro na vitrine da frente. Turistas frequentam o local para tirar fotos, e motoristas fazem fila para buscar encomendas para clientes ricos.
Vitrines refrigeradas mostram uma série de diferentes peças de côte de boeuf, todas perfeitamente alinhadas nas prateleiras, entre as quais cortes da raça Wagyu, da Espanha; da Longhorn, da Inglaterra, alimentada com capim; e da Montbéliarde, da França.
Em outra vitrine, peças clássicas e tiras de carne bovina francesa que podem ser consideradas de pouco valor no mundo anglo-saxão estão dependuradas em ganchos. “Os americanos usariam esses cortes para fazer hambúrguer. Os britânicos dariam para os cachorros”, disse ele.
Cerca de 20% da carne consumida na França atualmente é importada, principalmente da Alemanha, Inglaterra e Irlanda, e cada vez com mais frequência, de lugares como os Estados Unidos, Espanha, Argentina e Brasil. A carne americana ficou proibida em países da União Europeia até que os produtores garantissem que ela não tinha sido tratada com hormônios de crescimento.
O Caillebotte, bistrô disputadíssimo inaugurado no ano passado pelos donos do bem-sucedido Le Pantruche, que fica a algumas quadras de distância, serve uma bavette de angus preto do Kansas.
O restaurante Unico é especializado em carne importada da Argentina. O Beef Club, que serve carnes inglesas e escocesas escolhidas por Le Bourdonnec, instalou um açougue próprio no local para cumprir as normas rígidas da União Europeia quanto à carne maturada.
O recém-chegado mais americanizado na cena de restaurantes parisiense é o Café des Abattoirs — parte do pequeno império do chef Michel Rostang, que conquistou duas estrelas no guia Michelin, e de suas filhas Caroline e Sophie — localizado no centro de Paris.
Inspirado pelas churrascarias de Nova York, ele oferece aos clientes um miniavental xadrez nas cores laranja e branca em vez de guardanapos, facas grandes de cabo preto e vários cortes de angus preto, importados do Kansas, e de angus, da Escócia. A França marca presença com meio-quilo de entrecôtes de vacas nantaise e armoricaine da Bretanha.
Em cima da mesa há garrafas de plástico de molhos caseiros, incluindo churrasco, maionese de estragão, mostarda, pimenta e ketchup feito com raiz-forte e limão que combinaria melhor com um coquetel de camarão.
A costela curta, um corte que não existe na França, é assada por 72 horas em calor superbaixo em um forno de última geração; em seguida, é finalizada em uma grelha espanhola da Josper, alimentada por lenha e videiras. O resultado poderia ganhar o prêmio de carne mais marmorizada de Paris.
Fonte: iG