Responsabilidades fiscal e social andam juntas, diz Persio Arida


O economista Persio Arida, um dos pais do Plano Real e integrante da equipe de transição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afirmou nesta terça (15) que “responsabilidades fiscal e social andam juntas, não são opostas”.

Persio respondia a perguntas após palestra durante uma conferência realizada em Nova York pelo Lide, grupo empresarial fundado pelo ex-governador paulista João Doria.

Ele foi questionado acerca do debate iniciado por Lula no discurso em que opôs a ideia de prioridade social à responsabilidade fiscal, que gerou alarido no mercado financeiro. “Políticas sociais sem responsabilidade fiscal geram uma crise econômica que acaba por inviabilizá-las. Temos exemplos opostos também”, afirmou.

Depois, sugeriu uma Lei de Responsabilidade Social, com métricas estabelecidas no setor, semelhante à Lei de Reponsabilidade Fiscal dos anos Fernando Henrique Cardoso.

“Se você avançar num front e não no outro, mais cedo ou mais tarde não conseguirá fazer nenhuma avanço”, disse, limitando sua resposta por questões de sigilo impostas aos integrantes da equipe de transição. “Devemos ambicionar um crescimento maior, mas a inclusão social depende da educação. No curto prazo, no entanto, temos de atender essa massa marginalizada, que está passando fome”, disse.

Ele diz que as transferências “consensuais” de renda atuais partem de um gasto anual estimado de R$ 70 bilhões, mas considerou que criar “excepcionalidades” e vinculações de despesas não são o melhor caminho. “Isso vai estar no Orçamento todos os anos que for necessário aprovar”, disse Persio, defensor de instrumentos como o teto de gastos.

“Pode ser que sejam necessários fundos específicos” para o combate à miséria, disse, admitindo a possibilidade de usar recursos oriundos de desestatização para tal fim.

Divergiu de André Lara Resende, também integrante da transição e pai do Real, ao dizer ser contrário à expansão do gasto público para cobrir tais despesas.

Ele vê um cenário adverso para o ano que vem, com a queda do crescimento americano e as dificuldades chinesas. Persio, cotado para o Ministério da Fazenda ou outro posto na economia sob Lula, fez uma defesa de três pontos de reforma.

“Primeiro, abertura e integração ao mundo. O Brasil tem uma economia fechada. Veja o caso do Chile, a vantagem de crescer com uma economia aberta. Temos de firmar o acordo Mercosul-União Europeia, entrar na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), nos integrarmos ao máximo à economia mundial”, afirmou.

Também defendeu a reforma do Estado, passando pela administrativa, com unificação de carreiras e bônus de estímulo a servidores públicos com bom desempenho. “É necessário revisar os gastos. Vemos camadas e camadas de gastos que perderam o sentido”, afirmou.

Persio também fez um elogio à independência do Banco Central, algo já criticado por Lula. “Seria um retrocesso enorme perder a independência”, disse, elogiando o presidente do órgão, Roberto Campos Neto, também presente ao evento. “O papel regulador é fundamental e requer independência”, disse.

Voltou a defender a reforma tributária, prevendo que seja possível “avançar nas duas PECs do IVA”, as propostas de unificação de impostos federais e estaduais. “É factível conseguir isso em seis ou oito meses”, afirmou.

O ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, que foi presidente do Banco Central durante os oito anos do governo Lula, disse que é possível “crescer mais e melhor” com responsabilidade fiscal, mas levando em conta a realidade.

“É irrealista achar que o governo novo vai dizer para a família que ganha R$ 600 de auxílio para receber menos. Aí temos um problema de orçamento, uma negociação complicada”, disse Meirelles. Ele defendeu o “waiver”, o gasto excepcional acima do teto. “A licença para gastar precisa ter limite”, afirmou, afirmando que um caminho é o corte dos benefícios tributários.

Fez piada com a despesa na Empresa de Planejamento e Logística, criada no governo de Dilma Rousseff (PT) para implantar o trem-bala —que nunca se materializou. Também na mesa de debatedores, o ex-ministro da Fazenda de Dilma Joaquim Levy, hoje no Banco Safra, sorriu amarelo.

Em tom descontraído, Meirelles negou ter dito a investidores que “Lula dilmou”, ao comentar a questão do discurso do petista.

“A maior política social não é chamar um benefício de auxílio emergencial ou de Bolsa Família. A política social sustentável é a retomada do crescimento econômico, com geração de emprego e renda. Não há política social que se sustente, sem crescer em níveis elevados e por períodos prolongados. O setor bancário está convicto de que o Brasil deve e pode crescer a taxas mais promissoras”, afirmou Isaac Sidney, presidente da Febraban (Federação Brasileira de Bancos).

“O Brasil investe cerca de 15% do seu PIB, muito menos que a maioria dos países emergentes e longe do que necessitamos para crescer. E qual a razão de ainda estarmos investindo pouco? Está no modelo. O investimento público se exauriu, colapsou. Temos de reconhecer que o novo modelo de investimentos a ser, incessantemente, perseguido deve buscar a liderança e o protagonismo do capital privado”, disse.

Sidney defendeu também a responsabilidade fiscal, além de criticar indiretamente a balbúrdia política do governo de Jair Bolsonaro (PL). “O país precisa voltar a ter estabilidade”, disse, elogiando o trabalho do BC na trajetória da inflação.

“Confiamos nas nossas instituições, que não fraquejaram. Muito menos deveríamos gastar nossa energia em discussões inúteis, polêmicas rasas e debates enviesados. O Brasil precisa de uma grande conjunção de forças, de um pacto, de debates de ideias, e não de retóricas, ataques e bravatas.”

O empresário Rubens Ometto, do grupo Cosan, disse esperar previsibilidade do governo Lula. “Queremos que os nomes da economia sejam anunciados logo”, disse. “É importante o governo não recorrer a soluções simples. O que aconteceu com o preço dos combustíveis [no governo Dilma] quase destruiu o mercado de etanol”, afirmou, defendendo o seu negócio principal —energia renovável.

“O Brasil pode gerar mais crédito de carbono no mundo e atingir as metas de emissão zero em 2050. O mercado internacional ainda não paga o sequestro de carbono [da floresta amazônica] no Brasil como paga na Europa”, afirmou.

Fonte: Folha de São Paulo

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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