PT completa 45 anos sob o desafio de renovar o discurso e as lideranças

Dificuldade para abrir espaço a novas lideranças e o esgotamento da “marca” de inclusão social são alguns dos principais desafios no horizonte do PT, sigla do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que completou 45 anos na segunda-feira.

Pesquisadores da história do partido e cientistas políticos avaliam que o crescimento petista no primeiro mandato de Lula —cujo ritmo não se repetiu nos últimos anos — teve o efeito colateral de engessar a legenda na disputa de mandatos eletivos. Além da dependência atual de Lula, que ainda avalia se tentará a reeleição em 2026, a trajetória atrapalhou uma atualização do discurso para novas manifestações populares, como os evangélicos e os pequenos empreendedores.

Há, por outro lado, o reconhecimento de que o PT segue sendo o partido mais “orgânico” do país. Pesquisa Datafolha nas eleições de 2022 apontou que 35% dos entrevistados se diziam simpatizantes da sigla, bem à frente do PL, do então presidente Jair Bolsonaro, que aparecia em segundo com 20%. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que o PT saiu de 1,3 milhão de filiados em 2010, no fim da primeira passagem de Lula pela Presidência, para cerca de 1,6 milhão atualmente. Apenas o MDB tem mais filiados, com cerca de 2 milhões, mas encolheu no mesmo período.

— O PT acabou se tornando vítima do próprio sucesso político. As vitórias eleitorais impedem que ocorram muitas críticas internamente, e acabam desconectando o partido de suas bases, já que as lideranças que antes faziam interlocução com movimentos sociais passam a fazer parte ou da máquina partidária ou dos mandatos eletivos — aponta o historiador Lincoln Secco, autor de “A História do PT”.

Na avaliação do pesquisador, o partido que surgiu nos anos 1980 tendo a “classe trabalhadora organizada” e sindicalizada como eixo, e que cresceu eleitoralmente ao ampliar o diálogo com a massa de trabalhadores informais ao longo dos anos 1990, agora se vê desafiado pela falta de discurso para uma “classe média que é muito plural” — composta desde pequenos empresários e empreendedores até profissionais com pouca ou nenhuma folga no orçamento mensal.

Para o cientista político Josué Medeiros, coordenador do Observatório Político e Eleitoral da UFRJ, falta renovação no discurso petista para dar conta de transformações no país, como o crescimento evangélico, e no mundo, com as mudanças climáticas. Isto se relaciona, segundo Medeiros, com a dificuldade de “discutir o futuro pós-Lula”, especialmente após a ofensiva da Lava-Jato, na década passada, momento que forçou o partido a centrar esforços na soltura de sua principal liderança.

— Lula unifica o PT, enquanto o surgimento de novas lideranças tende a causar divisão. Houve debates internos desde o mensalão (em 2005), mas a prisão do Lula unificou tudo de novo. Sem ele, o risco de uma divisão fratricida no partido passou a ser grande — avalia Medeiros.

A Lava-Jato coincidiu com uma queda de representação do PT em prefeituras e na Câmara dos Deputados. O partido recuperou terreno com a volta de Lula ao cenário eleitoral, após reverter suas condenações pela Lava-Jato em 2021, mas sem retomar o patamar da primeira passagem do petista pelo Planalto.

O PT manteve, por outro lado, o patamar de governadores eleitos, graças a uma sequência de vitórias em estados do Nordeste, como Bahia, Ceará e Piauí. A resiliência eleitoral do partido na região vem estimulando uma mobilização interna para que uma liderança nordestina seja alçada à presidência do PT, ao fim do mandato de Gleisi Hoffmann, do Paraná, neste ano. O favorito é Edinho Silva, ex-prefeito de Araraquara (SP), mas nomes como o atual líder do governo na Câmara, José Guimarães (CE), já foram cotados.

O historiador Lincoln Secco observa que a atual disputa interna envolve dois nomes da corrente majoritária do PT, a Construindo um Novo Brasil, que tem Lula como principal liderança. Na avaliação de Secco, o cenário exemplifica um partido mais pujante na disputa pela ocupação de espaços do que para debater novas propostas, como foram os programas de transferência de renda no primeiro governo Lula.
— O partido tem novos quadros, mas não tem um programa a apresentar ao país. A inclusão social, bem ou mal, já foi feita. Pode ser que em 2026 o PT continue a ser um ponto de convergência para os que defendem algo melhor do que o bolsonarismo, mas isso é muito pouco, e não é para o futuro.

Fonte: O Globo

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

Menu de Topo