PM baiana não aparece em delegacia para registrar boletim de ocorrência

A “operação tartaruga” deflagrada por policiais militares da Bahia neste sábado (19) prejudicou os trabalhos numa das delegacias mais movimentadas de Salvador. Entre 8h e 15h, nenhum PM apareceu no 1º Distrito Policial, na região dos Barris, para registrar ocorrência ou conduzir presos.

A situação, segundo o chefe do plantão no local, agente Milton Manoel, foi completamente atípica: segundo ele, o movimento de PMs na unidade costuma ser intenso mesmo em feriados. “Só tinha visto algo assim em outras greves [da PM]”, afirmou.

Na delegacia, que responde por amplas áreas de Salvador, como centro, Barbalho, Sete Portas, Comércio e Garcia, apenas oito ocorrências (quatro roubos e quatro furtos) foram registradas no período -todas pelas próprias vítimas.

A reportagem constatou situação semelhante, por volta das 17h deste sábado, no 7º DP de Salvador, no Rio Vermelho, bairro que concentra restaurantes, hotéis e bares. Apenas um PM tinha aparecido até então, o que é inusual, segundo investigadores ouvidos no local. Numa companhia da PM próxima, policiais confirmavam que a “operação tartaruga” acontecia.

Essa espécie de “greve branca” da categoria começou a ser articulada após PMs em vários pontos do Estado passarem a madrugada deste sábado aquartelados, em protesto contra a prisão, na véspera, de Marco Prisco, vereador pelo PSDB em Salvador e líder da greve que a categoria promoveu nesta semana.

Oficiais graduados percorreram quarteis sábado de manhã apelando pelo retorno e ameaçando demitir grevistas. Soldados ouvidos pela Folhadisseram que retomariam as funções, mas apenas para evitar retaliações.

O plano, contudo, era atender apenas chamados urgentes da população ou situações de risco que envolvessem outros policiais.

“Vou cumprir as 12 horas do meu turno, mas não vou registrar ocorrência nenhuma. Só viemos para a rua porque o comando ameaçou nos demitir”, disse pela manhã um soldado, pedindo anonimato.

“AÇÃO ESPONTÂNEA”

Representante da Aspra, a associação de praças liderada por Prisco, o soldado Ivan Leite confirmou a “operação tartaruga”, mas procurou se dissociar da ação -classificou a atitude dos PMs como “espontânea” e “natural”.

“A tropa se sentiu traída pelo governo [após a prisão de Prisco]. É normal que os policiais não retornem ao trabalho com força total”, afirmou.

A greve da PM baiana se estendeu por cerca de dois dias entre terça (15) e quinta-feira (17). Foi acompanhada por uma explosão da criminalidade em cidades como Salvador e Feira de Santana, e terminou com governo e grevistas cedendo em concessões e reivindicações.

A situação voltou a ficar tensa na sexta-feira (18), após a prisão de Prisco pela Polícia Federal. O governo Jaques Wagner (PT) negou relação com a detenção, pedida pelo Ministério Público Federal, e disse que os termos do acordo estavam mantidos.

AQUARTELAMENTO

A versão não conteve a insatisfação da categoria, e PMs passaram a madrugada de sábado sem ir às ruas em protesto contra a prisão, o que se refletiu em violência acima da média em cidades como Salvador e Feira de Santana.

O comandante da PM, coronel Alfredo Castro, confirmou à Folha, por volta da 1h deste sábado, que havia registros de aquartelamento em curso “em maior ou menor escala” pelo Estado.

Pela manhã, Castro reconheceu que os registros de violência tinham aumentado, o que foi confirmado pelos números: houve ao menos 16 homicídios em Salvador de sexta para sábado (a média diária na cidade é de cinco casos) e cinco em Feira de Santana (média de um caso por dia).

O comandante da PM passou a madrugada articulando uma carta para tentar acalmar os ânimos da tropa. Costurou o documento com o deputado estadual Tadeu Fernandes (PSB) –capitão da PM que busca ser um porta-voz político da categoria– e com a ex-ministra do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Eliana Calmon, pré-candidata ao Senado pelo PSB e futura rival do petismo baiano nas eleições de outubro.

Oficiais consultados pela Folha negaram ação política nas conversas do comandante com Fernandes e Calmon. Afirmaram que Fernandes participou como interlocutor com a categoria e Calmon, com argumentos jurídicos.

Wagner, que concedeu entrevista coletiva na quinta-feira ao lado de autoridades federais para anunciar o fim da greve, não se manifestou desde a prisão de Prisco. Secretaria de Segurança e comando da PM apenas emitiram notas dissociando o governo da operação de detenção. Nos bastidores, assessores do governo sugeriam uma estratégia de tratar o problema do aquartelamento como uma questão interna da PM.

Enquanto a situação continua tensa na corporação, tropas federais enviadas à Bahia durante a greve a pedido do governo Wagner permanecem no Estado em ações de patrulhamento. Prisco, que passou cerca de 40 dias detido após a greve que liderou em 2012, foi levado ao presídio da Papuda, em Brasília, de onde sua defesa tentava neste sábado articular um alvará de soltura – o caso será analisado pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Fonte: Folha de São Paulo

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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