Jornada marcada por desafios – Filipe Pereira dos Santos


Sou Filipe Pereira dos Santos, um homem preto natural de Alagoinhas e oceanógrafo. Sou filho de Carmen Pereira dos Santos, enfermeira, e José Petronio de Jesus Santos, agente de infraestrutura. Sou neto de analfabetos e uma carreira acadêmica não estava nos meus planos iniciais, mas graças à minha mãe, tive acesso a uma excelente educação por meio de uma bolsa de estudos integral no Colégio Star em Alagoinhas, desde a 1ª série do ensino fundamental até o 3º ano do Ensino Médio. Foi na escola e assistindo programas da TV Cultura que minha paixão pela ciência foi despertada. Desde a 3ª série do fundamental, decidi que me tornaria um cientista, pois sempre tive uma enorme curiosidade em entender como a Terra funciona.

Minha jornada acadêmica teve um começo confuso. Em 2008, fui aprovado no vestibular da UEFS para estudar Ciências Biológicas, me tornando o primeiro membro da minha família a ingressar em uma universidade pública. No entanto, percebi que meus interesses eram mais interdisciplinares e decidi fazer o vestibular da UFBA para Oceanografia. Nesse curso, poderia estudar física, química, biologia e geologia. Foi na UFBA que conheci o Prof. Carlos Lentini, que me encantou com o campo da Oceanografia Física durante uma disciplina. Nas conversas com ele, fui convencido a buscar uma formação mais abrangente na USP. Assim, em 2011, realizei o processo de transferência externa da UFBA para a USP e fui aprovado, mudando-me para São Paulo em 2012.

Minha experiência na USP verdadeiramente ampliou meus horizontes. Já em 2012, comecei a trabalhar em um Programa de Iniciação Científica no Laboratório de Dinâmica Oceânica, sob a orientação do Prof. Ilson Silveira. Durante esse processo, aprendi a língua inglesa ao interagir com pesquisadores estrangeiros e por meio do acesso a materiais didáticos na universidade. Em 2016, recebi uma bolsa de intercâmbio do MEC para desenvolver pesquisa na Universidade de Massachusetts, nos EUA. Foi nesse momento que decidi focar meus estudos na interação entre a física e a biologia dos oceanos para explicar a distribuição das microalgas do plâncton marinho no planeta.

Em 2017, ingressei diretamente no programa de doutorado na USP, matriculando-me no programa de dupla titulação entre o Instituto Oceanográfico da USP e a Escola de Ciências do Mar e Tecnologia da Universidade de Massachusetts. Essa oportunidade me proporcionou uma experiência internacional mesmo estudando no Brasil, abrindo portas para recursos, conexões e oportunidades que eu não teria de outra forma. Durante o doutorado, pude aprimorar significativamente meu inglês devido às interações semanais com meu orientador e colegas nos EUA. Um requisito do programa era passar pelo menos um ano em Massachusetts. Embora a viagem tenha sido adiada devido à pandemia, finalmente consegui ir no final de 2021 e permaneci lá até outubro de 2022. Durante esse período, tive a oportunidade de conhecer pesquisadores do Instituto Scripps da Universidade da Califórnia, um dos maiores e mais conceituados institutos de pesquisa em oceanografia do mundo, durante um congresso chamado GRC. Nossas conversas levaram ao desenvolvimento de um projeto de pesquisa para estudar como processos físicos e biológicos podem desencadear florações de algas nocivas. Esse projeto foi selecionado pelo Programa de Bolsas de Pós-doutorado do Presidente da Universidade da Califórnia.

Esse programa foi criado em 1984 com o objetivo de incentivar pesquisadores de grupos minorizados a seguir carreiras acadêmicas na Universidade da Califórnia. Atualmente, oferece bolsas de pesquisa de pós-doutorado, desenvolvimento profissional e orientação para acadêmicos de destaque em todos os campos, cujas pesquisas, ensino e serviços contribuam para o aumento da diversidade e igualdade de oportunidades. Fiquei surpreso e honrado quando soube que fui selecionado para uma das 35 bolsas disponíveis, em um processo que contou com mais de 800 candidatos. Essa bolsa é, na verdade, uma ação afirmativa da Universidade da Califórnia e oferece incentivos para que os bolsistas se tornem professores universitários.

Concluí meu doutorado em abril deste ano, com uma pesquisa sobre interações físico-biológicas na costa do Rio de Janeiro, uma área de grande importância devido à exploração de petróleo e gás. Agora, estou me preparando para iniciar meu trabalho na Universidade da Califórnia em novembro deste ano, com uma previsão inicial de dois anos de dedicação a essa instituição renomada. Durante esse período, continuarei a me aprofundar em minha pesquisa sobre as microalgas do plâncton marinho e sua relação com os processos físicos e biológicos.

Minha jornada de vida tem sido marcada por desafios, dedicação e oportunidades. Sou grato a todos que me apoiaram ao longo do caminho, especialmente minha família, mentores e instituições educacionais que me proporcionaram conhecimento e experiências valiosas. Espero que minha história possa inspirar outros jovens a perseguirem seus sonhos e acreditarem em seu potencial, independentemente de sua origem.

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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