Expo Alagoinhas: Além da programação voltada para o agronegócio, evento ressalta a importância da agricultura familiar na região

Quem passa pela Expo Alagoinhas e vê uma das maiores feiras em número de estandes da região encontra – como diria o bom baianês – “de um tudo”, entre animais de grande porte, oficinas, cursos, palestras, comida e expositores, mas um detalhe chama a atenção próximo à entrada: é a casinha de taipa, com direito a horta de produtos frescos , galinheiro, boneco de palha. A porta fica aberta, a entrada é liberada e quem chega pode se surpreender com as paredes de barro, com os vasinhos charmosos na porta ou com o fogão à lenha, mas não imagina que todo o espaço tenha sido construído por mãos de um baiano “retado”, que passou cerca de 3 semanas trabalhando na construção.

César Silva Moura ergueu a casa, plantou milho, aipim, bananeira, alface, coentro, couve, cebolinha. E trouxe em forma de trabalho um pouco da memória afetiva que tinha de Nova Soure, cidade onde nasceu. No Parque de Exposições Miguel Santos Fontes, um cantinho de hortas familiares, rústico, floresce ao sol de mais uma primavera baiana e ressalta dizer: além da oportunidade de realizar grandes negócios, a feira também vem fortalecer, incentivar e fazer lembrar a história da agricultura familiar e dos pequenos produtores da região.

“Eu nasci numa casa dessas”, afirmou Moura, que completou, “hoje, nos 42 anos que eu sou nascido, que eu tenho agora, eu vejo que antigamente era tudo mais difícil. Não existiam essas coisas que tem hoje. Hoje o pessoal não quer nem pegar no barro. É muito importante pra essas crianças novas aprender e saber como foi no nosso tempo, no tempo dos nossos pais, o que passou, uma dificuldade terrível”.

Moura começou cedo no trabalho. Aos 16 anos, ergueu a primeira casa. “Aprendi com meu pai, com meus avós, porque, na realidade, a casa dos meus avós era de pindoba. Era coberta de telha. A cama era de vara”, explicou.

Pra quem acha que o trabalho é simples, Moura soltou logo a “receita”. “Essa casa? Vai no mato, pega os paus.
Depois da madeira em pé, vem as varas traçadas. Antigamente, muita gente usava cipó, não era arame. A legítima mesmo era de cipó do mato. Depois dali vem o processamento do barro. Antigamente, se juntava os familiares, os amigos, quatro, cinco pessoas. Todo mundo pisava o barro, molhava e pisava junto. Ia colocando o barro e tapando de mão. Um fica por lá, outro fica por cá. O que é mais difícil fazer? Tudo. A madeira hoje não é mais como era. Se for madeira boa, como Maçaranduba, dura muito tempo”, contou o agricultor, que garante que o tipo de construção, apesar de rudimentar, é mais arejado. “É mais fresca do que a casa de bloco. Antigamente, dizia que o pessoal fazia muito menino [na casa] porque era muito frio”, brincou César Moura.

Dos tempos da casa de taipa para Alagoinhas, muita água rolou na vida do agricultor. Quando questionado sobre o que a agricultura familiar mudou na sua vida, César Moura soltou logo: conhecimento. “Mudou conhecimento. Eu não tinha conhecimento. Não sabia lidar com as pessoas”, comentou.

Pai de 4 filhos, o rapaz que construiu a primeira casa em Nova Soure e sustentou a família de 22 irmãos quando o pai decidiu tentar a vida em São Paulo e não tinha condições financeiras de voltar, é hoje representante de uma associação de agricultura familiar e traz, para Alagoinhas, um espaço de reflexão sobre o plantio que muda realidades.

A Bahia é a unidade da federação com maior número de agricultores familiares do Brasil. São mais de 665 mil estabelecimentos rurais de agricultores responsáveis, por exemplo, por 90% da mandioca plantada em todo o estado. Pessoas como César, que garantem que produtos de qualidade continuem chegando à mesa do consumidor final. Nada de agrotóxicos, químicos ou grande-escala. O fortalecimento dos pequenos produtores agrários também requer visibilidade, reconhecimento e valorização. “Eu tenho muito orgulho. A virada foi muito grande. E quero ter mais virada ainda. Eu quero mostrar muita coisa para o meu povo, para meus amigos, para meus filhos, meus netos que vêm por aí”, enfatizou César Moura.

Serviço

A casa de Taipa e a horta ficam próximos à administração da Expo Alagoinhas e o espaço permanece aberto ao público durante todos os dias de Exposição, a partir das 8h.

Fotos: SECOM PMA

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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