Escolhi não ser um homem branco, diz Pedro Cardoso, que lança livro independente
Pedro Cardoso escolheu não ser um homem branco. “Eu me insurgi”, afirma. “Me fiz diferente do que estaria condenado a ser pelo lugar na sociedade e no tempo que me coube existir neste mundo.”
O ator admite que não é possível subverter a própria biologia, mas, sim, a cultura. E, ao se reconhecer como parte da branquitude, resolveu se rebelar contra ela.
“Eu passei a me enxergar no lugar de branquitude no momento em que a africanidade brasileira, de uns anos para cá, começou a dizer que eu estava nesse lugar”, explica ele à Folha. “Fiquei muito assustado porque, independentemente de minhas ideologias e apostas políticas, a branquitude é um lugar inevitável de nascimento. E, para quem nasce nesse lugar no Brasil, não basta reconhecer nossas injustiças sociais. É preciso se mover em direção à igualdade.”
Este seu movimento deliberado, diz, inclui “ler autores que não me chegam na primeira mão”, “limpar o meu próprio banheiro” e “buscar produzir mais justiça econômica na minha atuação no mundo”. Por isso, o ator escolheu a editora independente Barraco Editorial para lançar um livro de crônicas, intitulado “Dias Sem Glória”, em coautoria com o jornalista Aquiles Marchel Argolo. O livro está em pré-venda no site da Barraco Editorial.
“Se eu fosse editar o livro numa Companhia das Letras ou na editora Record, faria mais um gesto para a concentração de renda”, afirma ele, que já publicou dois livros pela última, “O Livro dos Títulos” e “Pedro Cardoso Eu Mesmo”. Para ele, publicar pela Barraco Editorial é um pequeno gesto na contramão da mais-valia.
“É um ato político e econômico, não um ato de generosidade. A justiça social de que a gente tanto fala é uma questão de justiça econômica. O nome da liberdade é dinheiro.”
Cardoso critica a maneira como a venda de exemplares é partilhada entre autor, editora e livreiro nos esquemas vigentes no mundo editorial. Autores, em geral, ficam com 10% do valor de capa. “Sobra 90%. Fica com quem?”, questiona ele.
“No Brasil, o dinheiro ainda está nas mãos da branquitude europeia. Por isso que a Barraco Editorial é um projeto de justiça econômica.”
Criada em 2023 pelo escritor Wesley Barbosa, 34, a Barraco Editorial surgiu para abrigar autores com perspectivas antirracistas e também aqueles das periferias do Brasil, como seu fundador, nascido em Itapecerica da Serra, na região metropolitana de São Paulo.
“Esse nome, Barraco, também tem a ver também com essa batalha para continuar inserido no mercado editorial sem estar nele, no mainstream branco. Percebi que para eu conseguir estar nas feiras literárias, precisava de um CNPJ, e fundei uma editora para conseguir estar nesses ambientes, que é onde estão, supostamente, as pessoas que gostam de ler.”