Entenda como Anitta, ao declarar voto em Lula, pode impactar as eleições de 2022

Anitta declarou para os seus mais de 17 milhões de seguidores no Twitter que está com Lula nas eleições de 2022.

É a primeira vez que a cantora declara apoio a um candidato numa eleição —mas outros posicionamentos políticos da artista e a movimentação nas redes sociais depois da publicação sugerem que ela pode ter forte impacto sobre o jogo político.

Pedro Barciela, especialista de análise de redes, fez um levantamento de como o Twitter se comportou depois da publicação do thread da cantora. O que o gráfico gerado por ele mostra é o volume de postagens que continham o termo “Anitta” e em torno da arroba da cantora logo depois da declaração.

O primeiro dado que salta no levantamento é que o volume de usuários que a artista mobiliza vai muito além da política —ela chama para o debate perfis de fofoca, que ganharam um peso importante nas redes nos últimos anos, influenciadores e outros produtores culturais, caso do músico Lucas Silveira, da banda Fresno.

“A gente vê que há usuários de todos os cantos, de todas as correntes ideológicas. Até mesmo alguns atores que não necessariamente falaram sobre a Anitta ontem foram tragados pelo debate, como é o caso do Ciro Gomes.”

O pesquisador Fabio Malini ressalta o papel que megainfluenciadores como Anitta têm de atrair até atores que não necessariamente querem se envolver com política.

O influenciador local, de porte médio, fica muito mais à vontade para retuitar uma publicação de peso de Anitta que replicar algo de Lula ou Bolsonaro, por exemplo. “Grosso modo, ela consegue trazer pessoas mais ‘isentonas’ para o debate.”

Quem não se deu bem nessa história foi o núcleo bolsonarista, representado pela região azul do gráfico. Eles estarem posicionados longe do núcleo da cantora mostra que não conseguiram amplificar a narrativa deles sobre esse assunto.

O que esse grupo tentou fazer, segundo Barciela, foi ironizar a artista. “Isso pelo fato de ela nunca ter escondido que ela não entendia tanto de política e que buscou se inteirar nos últimos meses”, diz ele. “Eles tentam desqualificar a Anitta enquanto um ator político.”

E isso não deu certo fora da bolha deles. Quem está mais próximo da discussão sobre Anitta, tomado pelo movimento em vermelho do gráfico, é o vereador Carlos Bolsonaro, que publicou um vídeo em que a cantora pergunta, por exemplo, se os ministérios fazem parte da composição do Judiciário.

O fato de o filho Zero Dois estar perto do núcleo vermelho significa que pessoas ligadas à discussão levantada pela cantora foram até o perfil do vereador para fazer ataques a ele, segundo explica Barciela. E isso também revela como as publicações foram, em peso, a favor do posicionamento de Anitta.

Por que, então, esse núcleo bolsonarista insiste em interagir com esses artistas? Primeiro, porque usam esses nomes como trampolim para chegar ao ecossistema central das redes sociais —Mark Ruffalo, Leonardo DiCaprio e Daniela Mercury foram alguns outros atacados por esse núcleo. Segundo, porque isso também pega bem dentro da bolha deles, o que pode beneficiar uma campanha para o Legislativo.

Esse cenário significa que Anitta vai converter eleitores para Lula com sua postagem? É bem possível, na opinião de Malini, que é doutor em comunicação e cultura. “Se fosse duas campanhas atrás, eu diria que não. Mas no nível de tecnologia que temos hoje, é fundamental criar uma onda emocional que no fim vai acabar facilitando a tomada de decisão.”

Ainda que o voto tenha características ideológicas, ele ainda depende muito da emoção para consolidar escolhas e mobilizar indecisos —e hoje a agenda positiva, que fala em conquistas e esperança, está no campo petista, enquanto o bolsonarismo tem sido reativo, na visão do pesquisador.

Além disso, ele diz acreditar que Anitta tenha uma estratégia mais ampla de consolidar um movimento eleitoral a favor de Lula.

“A Anitta é o arquétipo de um novo tipo de cidadão com influência, que é capaz não apenas de declarar voto e sedimentar um público jovem, mas também de criar uma campanha paralela à oficial”, diz ele. “Essa ao meu ver será a grande novidade desta eleição –as campanhas feitas com recursos próprios na rede social de cada influencer que cresceu na pandemia.”

Há alguns indícios de que Anitta fez sua postagem de caso muito bem pensado. Primeiro, basta ver a escolha de palavras do tuíte original, que anuncia o início de algo mais amplo. “Quem quiser minha ajuda para fazer ele bombar”, escreveu ela, “é só me pedir”.

Segundo, a cantora ligou para Lula algumas vezes antecipando que anunciaria seu apoio, conforme mostrou reportagem do jornal O Globo.

E terceiro, ela já mostrou poder de fogo na mobilização para convencer jovens a tirar o título de eleitor, uma campanha que rendeu uma inscrição recorde depois do movimento. “Ela é a figura, sem dúvida alguma, que entra nesse debate com o maior potencial de se engajar com outros agrupamentos que traz de sua carreira artística”, avalia Barciela.

Ele vê similaridade com o que aconteceu nas últimas eleições presidenciais nos Estados Unidos, em que influenciadores também foram eficazes em convocar para o voto grupos que, historicamente, foram excluídos do processo eleitoral.

“Quando a gente pensa numa votação tão polarizada, é importante que os candidatos tenham acesso a esses influenciadores para que possam disseminar as informações. E isso, de certa forma, tira um pouco do peso das campanhas stricto sensu”, afirma o pesquisador.

“Quando a gente vê nas redes as manifestações em apoio ao ex-presidente Lula, elas dependem muito menos de agendas políticas e muito mais do show da Ludmilla, por exemplo, ou da toalha com o rosto do Lula em algum espaço.”

Fonte: Folha de São Paulo

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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