Temor contra microcefalia estimula fertilização in vitro

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Há quatro anos, a advogada Juliana*, 39, elaborou uma planilha com objetivos a alcançar antes de chegar aos 40 anos. Ser aprovada em um concurso público e engravidar figuravam no topo da lista. No ano passado, ela conseguiu, finalmente, a aprovação e resolveu se empenhar em realizar o sonho da maternidade.

Desde então, a imagem de uma garota magrinha, de pele negra, com um grande laço na cabeça começou a aparecer em seus pensamentos de forma recorrente. A filha, que nem tinha sido gerada, já tinha cara e até nome: Maria Júlia. O sonho, no entanto, foi inundado por uma avalanche de notícias negativas sobre o surto de zika vírus.

Preocupada com a possibilidade de ter um bebê com microcefalia – condição neurológica em que a cabeça e o cérebro da criança são menores -, Juliana procurou uma clínica de reprodução assistida para congelar os óvulos e poder utilizá-los mais tarde, quando o surto da doença já tiver sido controlado.

A decisão da advogada tem sido compartilhada por outras mulheres com a mesma faixa de idade. Em Salvador, a procura pelo procedimento em algumas clínicas de fertilização chegou a crescer 50% no último semestre por causa dos números alarmantes da microcefalia – até abril, na Bahia, foram notificados 608 casos em 136 municípios.

Especialista em reprodução humana e diretor de dois serviços de reprodução assistida na capital baiana, o ginecologista Joaquim Lopes acredita que a falta de uma perspectiva sobre o controle do zika vírus motivou a procura não só pelo congelamento de óvulos, mas também de embriões.

Segundo ele, a maioria das mulheres que buscam um dos dois serviços é maior de 35 anos e possui algum tipo de problema que pode causar infertilidade, como mioma ou endometriose.

“A partir dos 35 anos, a mulher já consumiu grande parte dos seus óvulos, por isso, a possibilidade de  congelá-lo é recomendada para aquelas que querem postergar o projeto da gravidez”, afirmou.

O valor do procedimento varia entre R$ 10 mil e R$ 15 mil e dura cerca de 12 dias. “A mulher toma um medicamento para estimular a produção de óvulos. Em seguida, eles são coletados e podem seguir congelados até o dia em que a paciente se sentir preparada para utilizá-los”, explicou a especialista em reprodução assistida Genevieve Coelho.

O procedimento de Juliana foi realizado com sucesso. Ela espera que, no próximo ano, possa realizar a fertilização e, finalmente, ter como comemorar o seu primeiro Dia das Mães.

“Muitas pessoas me julgaram como preconceituosa por ter resolvido adiar a gravidez. Não há nada de preconceituoso em querer que meu filho nasça sadio e tenha uma melhor qualidade de vida”, justificou.

Segurança

Além de garantir a possibilidade de realizar o sonho da maternidade futuramente, a fecundação feita in vitro, de acordo com explicação da especialista, pode reduzir os danos do zika vírus ao material genético.

Isso por conta do tratamento dado ao sêmen antes da fertilização. “O sêmen dos pacientes que tiveram suspeita de zika passa por um tratamento especial. Antes da fecundação, o sêmen passa por uma espécie de lavagem para limpá-lo do vírus. Dessa forma, as chances de a pessoa ter um filho com microcefalia são menores”, explicou a especialista.

*Nome fictício

Enquanto algumas mulheres estão investindo em meios para adiar a gravidez e evitar um caso de microcefalia na família, outras iniciaram tratamento para infertilidade, mesmo diante de um cenário preocupante para a saúde do bebê.

Aposta em outros meios para engravidar

Casados há 14 anos, a professora Patrícia Lopes, 38, e o técnico em informática Raimundo Lopes, 45, iniciaram, na última semana, um tratamento para engravidar. Portadora de endometriose, Patrícia já passou por cirurgia e enfrenta, há quatro anos, uma longa batalha contra a doença.

Esse ano, o casal reuniu todas as economias para, enfim, conseguir realizar o desejo de aumentar a família. Eles estão dispostos a pagar o valor necessário para ter nos braços, em breve, o fruto do casamento.

“Percebemos que chegou a hora de ter o nosso filho e estamos dispostos a encarar qualquer obstáculo, independentemente da microcefalia. Estamos preparados para cuidar dele de qualquer forma”, contou Patrícia.

Depois de criar duas irmãs mais novas, a estudante Simone Santana, 28, sente que, agora, é hora de ter o próprio filho. A vontade é tamanha que viajou 108 quilômetros de Feira de Santana para a capital baiana, na última semana, para tentar iniciar o tratamento.

“Sofro de uma má formação no útero desde muito nova, então quero me tratar o quanto antes para conseguir ter o nosso filhote, que é muito esperado por todos”, disse, animada.

Cuidados

Para as futuras mães, uma notícia animadora: na última semana de abril, a Bahia apresentou uma redução de 43% no número de novas notificações de microcefalia. Enquanto na primeira semana do mês foram registrados 16 novos casos, na semana seguinte, esse este número caiu para nove.

Mas, de acordo com a ginecologista Andrea Barreto, os cuidados para evitar a contaminação pelo zika ainda precisam ser redobrados. Segundo ela, além dos procedimentos para eliminar o foco do mosquito Aedes aegypti, é imprescindível o uso de repelentes.

“É importante que a gestante use diariamente repelente. É uma forma eficaz e barata de manter os mosquitos distantes. Lembrando que é necessário passar o produto três vezes ao dia”, recomendou.

Fonte: A Tarde

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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