Rei do Lixo negociou secretarias de BH diretamente com Fuad Noman, mostram mensagens
O empresário José Marcos de Moura, conhecido como o Rei do Lixo, negociou diretamente a indicação de aliados do União Brasil para secretarias de Belo Horizonte (MG) com o então prefeito da cidade, Fuad Noman (PSD), incluindo Bruno Barral à frente da Educação. Barral foi afastado do cargo na semana passada após ser alvo da terceira fase da operação Overclean da Polícia Federal (PF), que apura seu envolvimento com um esquema de corrupção em Salvador (BA).
Além de Barral, Moura e outros seis investigados foram alvo desta etapa da operação. Seu afastamento foi determinado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Kassio Nunes Marques. Ele acabou exonerado em definitivo pela prefeitura da capital mineira horas depois da decisão judicial.
Os investigadores da PF encontraram no celular do Rei do Lixo diálogos entre o empresário, que integra a executiva do União Brasil, e Fuad no WhatsApp após a reeleição do mineiro sobre o espaço que o partido teria no segundo mandato. A nomeação de Barral, em abril de 2024, fez parte da negociação para que a legenda embarcasse na chapa do prefeito, que à época patinava nas pesquisas.
As conversas captadas pela Polícia Federal indicam que Moura pleiteou duas secretarias, incluindo a de Educação, desde o princípio. Segundo informações obtidas pela equipe do blog junto a fontes a par da investigação, Fuad tentou resistir à investida em diálogos trocados com o Rei do Lixo.
O prefeito oferece ao União a criação de duas outras pastas de natureza social (Combate à Fome e Mobilidade Social) e pede que Moura “abra mão” do governo – no caso, de manter Barral na Educação.
Diante da reticência de Fuad, Moura responde que buscaria o presidente nacional da sigla, Antonio Rueda, e o vice, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto, para consultá-los sobre as contraofertas do político mineiro.
Antes de integrar o primeiro escalão de Belo Horizonte, Barral também chefiou a Secretaria de Educação de Salvador no segundo mandato de ACM Neto, de quem é próximo até hoje.
A última conversa entre Fuad e Moura ocorreu em 3 de dezembro de 2024, segundo a PF, quando o empresário pediu uma reunião com o prefeito. Barral acabou mantido na secretaria.
Além da Educação, o União ainda emplacou o vice, Álvaro Damião, que chegou a ser nomeado secretário de Governo e assumiu a prefeitura no fim de março após a morte do prefeito em decorrência de complicações do tratamento de um câncer.
Bruno Barral é apontado pela PF como integrante do grupo suspeito de fraudes em licitações, desvio de dinheiro público e lavagem de dinheiro através de contratos firmados durante sua gestão na Secretaria de Educação de Salvador no segundo mandato de ACM Neto, que também é próximo do Rei do Lixo.
A Polícia Federal encontrou R$ 120,8 mil em espécie – entre reais, dólares e euros – na casa do secretário. Apreensões de grandes quantias de dinheiro vivo não são novidade na Overclean. Como mostramos no blog no mês passado, a PF encontrou R$ 3,3 milhões nas casas e escritórios da primeira leva de investigados, incluindo o Rei do Lixo.
Ao comentar o afastamento do aliado pelo STF, o novo prefeito, Álvaro Damião, disse que “ninguém vai passar a mão na cabeça de secretário em Belo Horizonte” e frisou que a apuração da PF trata de sua gestão em Salvador. Horas depois, o titular da Educação acabaria exonerado.
A queda de Barral representa um baque para o União Brasil, que acaba de assumir a prefeitura de Belo Horizonte diante de um intenso desgaste de Damião junto à Câmara dos Vereadores, e vê novamente a PF aprofundando as investigações sobre outros governos sob o comando do partido, a exemplo de ACM Neto.
Além disso, as mensagens reforçam o que já se sabe nos bastidores há meses: que o Rei do Lixo, além de um poderoso empresário no setor da coleta seletiva, era também um dos principais articuladores do partido que surgiu a partir da fusão do DEM com o PSL.
Moura é apontado pela PF como o chefe de um esquema de desvio de emendas parlamentares direcionadas pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) a prefeituras que faziam licitações e contratos fraudulentos em conluio com a organização criminosa.
O esquema teria movimentado R$ 1,4 bilhão, ainda segundo a PF. O empresário foi preso em dezembro pela Overclean, mas foi solto no mesmo mês por decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).
A Polícia Federal chegou a pedir novamente a prisão de Moura, o que ocorreria na operação da última quinta-feira, mas a Procuradoria-Geral da República (PGR) se disse contrária à medida cautelar, como contamos no blog. O relator do caso no Supremo, Kassio Nunes Marques, acatou a manifestação do procurador-geral, Paulo Gonet.
A PF remeteu o caso ao STF em janeiro após o deputado federal Elmar Nascimento (União Brasil-BA) ser citado nas investigações. A corporação também tentou repassar o caso para o ministro Flávio Dino, que cuida de outras ações relacionadas a emendas, mas o sorteio de Kassio Nunes Marques como relator foi respaldado pelo presidente da Corte, Luís Roberto Barroso.
Fonte: O Globo – Blog de Malu Gaspar – Foto: Facebook