"Momento não é adequado para rever planos econômicos"' diz Adams
O governo federal conduziu nos últimos dias uma operação de convencimento junto ao Supremo Tribunal Federal e demonstra otimismo quanto às chances de conseguir dos ministros da Corte o adiamento do julgamento sobre alegadas perdas dos planos econômicos Bresser, Verão e Collor 1 e 2, aplicados entre 1987 e 1991. Ao iG, o advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Adams, defendeu que o adiamento da análise do caso, marcada para esta quarta-feira, se faz necessário principalmente por conta de dúvidas e inseguranças que o caso desperta nos próprios ministros.
O momento também é inapropriado, segundo o ministro. Em especial, pelo fato de o funcionamento do Congresso estar prejudicado pela Copa do Mundo e pelo período eleitoral. De acordo com Adams, uma eventual decisão do STF contrária aos bancos exigiria uma ação rápida do governo e uma articulação no Congresso para aprovar medidas que ajudassem a compensar uma retração na oferta de crédito decorrente do julgamento.
“Isso representa retirar do mercado de dez a oito vezes o valor de alavancagem em oferta de crédito. Estamos retirando do mercado uma oferta de crédito na casa de R$ 1 trilhão. Você imagina o que pode ter de impacto em termos de juros”, disse Adams. “Se houver necessidade de uma intervenção estatal do ponto de vista de estabilização da economia, é mais adequado que isso aconteça no momento em que o Congresso esteja mobilizado, o que não ocorre hoje por conta do processo eleitoral e até mesmo da Copa”, emendou.
Nos bastidores do Supremo, a expectativa é pelo adiamento. Alguns ministros já estão com votos prontos, como um dos relatores do caso, o ministro Dias Toffoli. Os outros dois relatores do caso, ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski têm manifestado preocupação com o processo, principalmente com a falta de dados concretos sobre os impactos financeiros contra os bancos durante o período de vigência desses planos econômicos.
A polêmica, atualmente, diz respeito ao lucro real dos bancos durante a vigência dos planos, entre o final dos anos de 1980 e início dos anos de 1990. O Banco Central argumenta que esse lucro nem sequer chegou a R$ 5 bilhões. O Ministério Público Federal (MPF) chegou a falar em R$ 441 bilhões. O valor do lucro dos bancos é tido como vital não somente para apontar se os bancos se aproveitaram da instabilidade da economia para maximizar seus faturamentos, como também para se estipular eventuais indenizações aos correntistas, caso o STF se manifeste a favor deles.
iG – Depois das petições da Procuradoria-Geral da República e do reconhecimento de problemas nos cálculos de impacto dessa ação do STF na economia brasileira, o senhor acredita que o Supremo deve adiar a análise desse processo?
Luís Inácio Adams – Eu não sei se eles vão adiar. Agora nós temos apresentado argumentos que justificam esse adiamento, que também se confirmou com a própria posição da PGR, que peticionou nesse sentido no processo. Então, o que vai ser julgado ainda é difícil de antecipar. Agora, eu acho que o momento não é o momento mais adequado para se discutir essa questão no Supremo.
Mas por qual motivo?
Porque seria necessária, antes de mais nada, uma dimensão um pouco mais precisa do que estamos avaliando em termos de impacto, em temos de repercussão. E segundo, se houver necessidade de uma intervenção estatal do ponto de vista de estabilização da economia, é mais adequado que isso aconteça no momento em que o Congresso esteja mobilizado, o que não ocorre hoje por conta do processo eleitoral e até mesmo da Copa. Porque, provavelmente, será necessária uma posição do próprio Congresso Nacional.
A intervenção do Congresso seria em que sentido? A AGU já tem algum indicativo ou manifestação nesse aspecto?
Não sei. Qual a medida a ser tomada? Isso vai depender do impacto da ação. Agora, evidentemente, tem que se buscar uma solução que se compatibilize a jurisprudência e a realidade econômica e financeira do Brasil. De forma que o crescimento econômico não possa ser prejudicado por isso. Então, qual a medida exata? Eu não tenho como antecipar.
Existe um conflito de dados no que se refere à margem de lucro dos Bancos, a AGU tem uma ideia concreta do impacto financeiro da ação caso o STF se manifeste a favor dos correntistas?
Os cálculos apresentados que apontavam a suposta lucratividade por conta dos planos econômicos, que estavam presentes nos apontamentos do MPF, estavam errados. Houve uma sobre-exposição de bases de calculo que levaram a um efeito cascata no momento de apuração de resultados. De fato, o resultado não é aquele apresentado. E isso inclusive foi reconhecido pelo Ministério Público e eu acho que justificou a petição do (Rodrigo) Janot no STF. Ele mesmo reconheceu no STF que esses cálculos devem ser refeitos.
Mas os cálculos de lucros tomaram como base a inflação do período?
O fato é que hoje banco lucra mais na inflação do que na falta de inflação. O processo inflacionário potencializa os ganhos financeiros para aqueles que tem condições de proteger e fazer blindagem contra o efeito inflacionário. E banco tem essa condição. O banco tem uma capacidade de aferir resultados muitos maiores e é isso que os números estão mostrando. Todos os planos econômicos quando foram implantados representaram uma queda na rentabilidade dos bancos. O que se demonstrou como lucros extorsivos se mostrou irreal, não verdadeiro.
É possível ter ideia hoje de quantos poupadores podem ser beneficiados com o julgamento do STF?
É difícil. Fala-se em 400 mil ações no país. Mas teríamos que levantar isso para poder quantificar. Cada banco tem o seu número de poupadores do período.
Em relação ao governo. Qual é o grande temor relacionado à essa ação? É a retração da economia em pleno ano eleitoral?
A principal preocupação é a retração da oferta de crédito. Quando você tem um passivo que afeta o capital próprio de uma empresa (no caso o banco), ela tem um limite de alavancagem que é associado ao volume de capital próprio. Então, toda vez que o capital próprio é reduzido, essa capacidade de alavancagem também é reduzida. E nós calculamos o impacto, no âmbito do governo, em R$ 150 bilhões. Tem variáveis ainda em aberto, o volume pode variar positivamente ou negativamente ainda. Em uma avaliação mais objetiva, dentro do contexto atual, estamos falando em R$ 150 bilhões.
Mas em relação à oferta de crédito?
Isso representa retirar do mercado de dez a oito vezes o valor de alavancagem em oferta de crédito. Estamos retirando do mercado uma oferta de crédito na casa de R$ 1 trilhão. Você imagina o que pode ter de impacto em termos de juros e etc.
E aí que o Congresso teria que entrar para legislar sobre um eventual impacto na economia?
Sim, sem dúvida. Tem que se cuidar um pouco dessa dinâmica, tendo que avaliar o impacto para poder ver que medidas são necessárias pra garantir o efetivamento funcionamento da máquina financeira.
O senhor teve uma série de conversas com os ministros do Supremo desde o ano passado. O que eles têm sinalizado nesse caso?
Ainda existem muitas dúvidas. Do ponto de vista jurídico, muitos já se posicionaram. Mas o fato é que ainda existem imprecisões que justificam o adiamento (do julgamento) para aprofundamento dessa questão. Hoje (ontem) mesmo, alguns ainda pediram avaliações econômicas, entre outras informações.
Fonte: iG