Lei é festejada, mas domésticas seguem lutando por mais direitos

Dois anos após a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 66, mais conhecida como PEC das Domésticas, 57% das empregadas domésticas da Bahia continuam na informalidade. Segundo o Sindicato das Empregadas Domésticas do Estado, a PEC impulsionou o aumento da formalização no setor, mas o número não passa de 43%.

“A PEC trouxe mudanças, por exemplo, em relação à formalização. O número de trabalhadoras com carteira assinada aumentou de 30% para 43%”, afirma a diretora do setor jurídico do Sindicato, Marinalva de Deus.

Aprovada pelo Senado em abril de 2013, a PEC só foi regulamentada e promulgada em agosto de 2014, quando trouxe mudanças importantes para a categoria. Porém, parte das medidas ficou pendente de aprovação pelo legislativo.

No último dia 17 de março, a Câmara dos Deputados concluiu a votação do projeto de lei que regulamenta os itens pendentes da PEC das Domésticas. Agora, o projeto segue para o Senado e depois para análise da presidente Dilma Rousseff.

Benefícios
A empregada doméstica Juscélia Pereira, 45 anos, começou a trabalhar na atividade há 13 anos, por conta das irmãs que também eram domésticas. Para ela, a PEC trouxe melhorias, sobretudo no que diz respeito à regulamentação do pagamento das horas extras. “Ficou muito melhor, porque eu trabalhava até tarde e não recebia nada a mais por isso”, conta.

A também empregada doméstica Durvalina Cardoso, 51 anos, trabalha em uma mesma casa de família há oito anos e diz que a PEC só veio regulamentar direitos que ela já usufruía desde que entrou nesse emprego e teve, logo no ato da contratação, sua carteira assinada. “Antes disso, trabalhei por quatro anos como diarista e fiquei sem pagar meu INSS. Vi que não valia a pena, fui prejudicada”, conclui ela, que acrescenta que conhece vários casos de colegas de profissão que não têm seus direitos respeitados.

Quanto às medidas que aguardam aprovação, Durvalina diz que tem expectativas de melhorar ainda mais sua situação como empregada e ver sua profissão valorizada. “Conversei com algumas pessoas e elas me disseram que os patrões já pagam os direitos que faltam ser aprovados. Já tem outros que se recusam a pagar. O meu, por exemplo, está aguardando a lei para pagar o FGTS”, revela.

Para a doméstica, um dos pontos mais importantes a serem regulamentados é o seguro-desemprego. “Acho esse direito fundamental, porque hoje a gente está empregada e amanhã não se sabe. Então, até arranjar outro emprego, vou viver de quê?”, reflete.

Durvalina Cardoso faz ainda um alerta às domésticas que não se preocupam com o futuro. “Tenho uma colega que trabalhou a vida toda como diarista. Ela agora está com câncer e enfrentando uma situação difícil. Não tem direito a auxílio-doença porque não trabalhava com carteira assinada. É por isso que sempre oriento minhas colegas a lutar pelos direitos”.

Conhecimento

Para Marinalva de Deus, do Sindicato das Empregadas Domésticas da Bahia, muitas mulheres ainda aceitam a informalidade porque precisam ou por falta de conhecimento dos direitos. “Elas têm medo de não arrumar outra coisa. Muitas não veem a importância de contribuir com a previdência para quando precisar dos benefícios. A maioria só dá importância ao hoje,se está trabalhando pensa que está tudo bem e não olha para o futuro”, destaca.

Por outro lado, segundo a diretora jurídica, houve um aumento de reclamações na Justiça por parte dos empregados domésticos, após a PEC. “Principalmente de agosto para cá, com a previsão de multa para o patrão que não assina a carteira, tem tido mais denúncias”.

Segundo a diretora jurídica, o cenário atual é marcado pelo melhor esclarecimento por parte dos trabalhadores domésticos e uma maior conscientização dos patrões, mas “ainda há uma questão cultural que impede a evolução das relações nesse tipo de trabalho, historicamente marcado pela informalidade e pelos baixos salários”, pontua Marinalva. Ela complementa: “Aqui no Nordeste a situação é ainda mais gritante. Há um pensamento enraizado de que o trabalho doméstico não precisa de qualificação nem ser formalizado. Em nosso estado, 95% da categoria é formada por mulheres e negras”.

Perspectivas

Se há dois anos a aprovação da PEC motivou o aumento das demissões, este ano não existe a mesma expectativa por parte do Sindicato das Domésticas da Bahia. “O novo assusta e traz insegurança. Os patrões ficaram com medo do aumento nas despesas. Agora o cenário é outro. Na prática, para quem já assina a carteira do seu empregado doméstico, não vai mudar muita coisa em termos de gastos, a não ser os 8% do FGTS”, afirma a diretora jurídica.

Otimista, ela diz que não acredita em novas demissões em 2015, mesmo se tratando de um ano difícil. “Tem residências que não têm como sobreviver sem um funcionário doméstico. É o caso de lares com crianças, idosos ou mulheres que trabalham fora. Este é um serviço essencial”.

Aprovação no Senado

Depois de duas votações na Câmara dos Deputados (em 12 e 17 de março deste ano), o texto-base que regulamenta a PEC das Domésticas voltou ao Senado e está à espera de votação. Ele passará a valer após aprovação da Casa e da  sanção presidencial. Não há data para que isso ocorra.

O retorno ao Senado (que aprovou o texto em julho de 2013) se deu porque  os deputados fizeram uma mudança em relação ao projeto que foi aprovado pelos senadores. A alteração diz respeito aos percentuais de contribuição ao INSS de patrões e empregados.

Os deputados rejeitaram a emenda que reduzia a contribuição do INSS de 12% para 8% tanto para patrões quanto para domésticos. Pelo texto aprovado na Câmara, patrões continuarão pagando 12% de INSS, enquanto o trabalhador vai pagar entre 8% e 11%, de acordo com a faixa salarial. O recolhimento de 8% do FGTS, que hoje é facultativo, passará a ser obrigatório para os patrões, que também vão ter de pagar 40% de multa sobre o saldo do FGTS em caso de demissão sem justa causa.

A PEC das Domésticas foi promulgada em abril de 2013. Ela estendeu ao empregado doméstico 16 direitos trabalhistas assegurados aos demais trabalhadores brasileiros. Porém, sete benefícios permanecem em aberto, à espera da regulamentação: indenização em demissões sem justa causa, conta no FGTS, salário-família, adicional noturno, auxílio-creche, seguro-desemprego e seguro contra acidente de trabalho. O texto aprovado define como empregado doméstico aquela pessoa que presta serviço de natureza não eventual por mais de dois dias na semana. Fica vedada a contratação de pessoa menor de 18 anos. O projeto confirma a jornada de trabalho diária de 8 horas, com possibilidade de duas horas extras por dia, sendo que a jornada semanal não pode passar de 44 horas  trabalhadas.

Fonte: Correio 24h

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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