Incluir o Brasil entre os 'cinco frágeis' é injusto, diz Bernardo Parnes

O Brasil não deveria estar no grupo dos “cinco frágeis”, apelido do momento no mercado financeiro, criado para apontar os países emergentes que seriam mais vulneráveis a um movimento de fuga de capitais (Turquia, Índia, Indonésia e África do Sul, além do Brasil).

“Acho injusto. O país nunca foi a maravilha que diziam anos atrás, mas também não está ruim como falam agora”, afirma Bernardo Parnes, presidente na América Latina do Deutsche Bank, um dos maiores bancos do mundo.

Ainda assim, segundo ele, o governo precisa arrumar suas contas para recuperar a confiança dos investidores – que andam com o pé atrás em relação ao Brasil.

A recente presença da presidente Dilma Rousseff no Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, ajuda, mas não é suficiente. “Ela falou o que os investidores queriam ouvir. Agora, mostra.”

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Danilo Verpa-31.jan.2014/Folhapress
Bernardo Parnes, que é presidente do banco alemão Deutsche Bank na América Latina
Bernardo Parnes, que é presidente do banco alemão Deutsche Bank na América Latina

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Folha – A tensão financeira que tomou conta dos países emergentes nos últimos dias pode se transformar em uma crise?
Bernardo Parnes – A redução dos estímulos à economia americana e as dúvidas em relação ao ritmo de crescimento da China vão sugar dólares que já estavam ou que iriam para os emergentes. Esses países vão ter que se arranjar com menos dinheiro disponível no mercado internacional.
Se isso vai virar crise ou não, ainda não dá para saber. Não está claro se, além dos fatores Estados Unidos e China, os emergentes estão perdendo dólares também por causa de uma onda de desconfiança em suas economias ou se é um movimento financeiro, de especulação com moedas e taxas de juros. Ou se são as duas coisas misturadas.

O que o sr. acha?
Neste momento, parece questão financeira. Se for isso, será passageiro. Se for desconfiança, será mais sério.

Pode afetar o Brasil?
Se a instabilidade persistir, pode. Nesse cenário, o dólar subiria, pressionaria a inflação e a consequência seria um aumento da taxa de juros, que inibiria o crescimento. Olha a Turquia. Eles aumentaram a taxa de juros em 5,5 pontos percentuais de uma só vez, para evitar uma desvalorização maior da moeda deles. Nunca tinha visto algo assim antes.

A presidente Dilma Rousseff foi ao Fórum Econômico Mundial de Davos [Suíça] na tentativa de diminuir o sentimento negativo que muitos investidores desenvolveram em relação ao Brasil. O sr. acha que ela conseguiu?
A presença dela foi muito importante, mas não é suficiente. A presidente foi lá e disse que está preocupada com a política fiscal, a inflação, os investimentos e as concessões. Ótimo. Era tudo o que os investidores queriam ouvir. Agora, mostra.

Por que os investidores estão com o pé tão atrás em relação ao Brasil?
O pessoal está cético, porque a gente vem de um ano com deficit fiscal maior que o esperado, gasto excessivo do setor público, deficit em conta-corrente e inflação alta. Não temos um problema estrutural, mas os fundamentos da economia precisam melhorar.
E agora colocaram o Brasil entre os “cinco frágeis”…

Mas o Brasil é um dos “cinco frágeis”?
Acho injusto dizer isso. O país nunca foi aquela maravilha que diziam alguns anos atrás, mas também não está tão ruim como dizem agora.
A economia está crescendo, embora bem abaixo do seu potencial. Dá para melhorar. É preciso focar a redução do gasto público e o controle efetivo da inflação e se esforçar mais para atrair investimento privado para a área de infraestrutura.
Um sinal de que não há medo estrutural no Brasil é que na nossa mesa de renda fixa há mais estrangeiros investindo do que brasileiros. Na renda variável, tem muito estrangeiro voltando para fazer compras seletivas. O Brasil não é um dos frágeis. Mas precisa melhorar.

A Argentina está quebrando?
Ao contrário, acho que a Argentina está caindo na real. Eles liberaram o câmbio e acho que a médio prazo isso vai ser bom. O Brasil pode sentir reflexo da crise deles, porque vendemos aos argentinos 8% de nossas exportações, principalmente automóveis. Podemos ser afetados. Mas acho que pouco.

O que o sr. espera da economia neste ano?
Inflação mais perto do teto que do centro da meta, na casa dos 6%. Crescimento de 2% do PIB (Produto Interno Bruto), o que, para o Brasil, é pouco. O consumo vai crescer moderadamente, devido à desaceleração da renda, do trabalho e do crédito.
O investimento deverá se beneficiar dos programas de concessões, mas pode ser afetado negativamente pela alta dos juros e pela volatilidade dos mercados internacionais. Sobretudo devido à política monetária dos EUA e à incerteza sobre o crescimento da China. Será um ano complexo.

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SAIBA MAIS: ENTENDA O APELIDO ‘5 FRÁGEIS’

Índia, Indonésia, Brasil, Turquia e África do Sul são chamados de “cinco frágeis” porque sofrem com duplos deficit -fiscal e de conta-corrente-, queda no crescimento do PIB, inflação pressionada e superior à meta e incerteza política causada por eleições neste ano.

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RAIO-X bernardo parnes

IDADE: 53

CARGO: Presidente do Deutsche Bank na América Latina

TRAJETÓRIA: Foi presidente da Merrill Lynch no Brasil, gestor dos investimentos pessoais do banqueiro José Safra

Fonte: Folha de São Paulo

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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