Google Street View faz 10 anos e inspira obras de arte

Em 25 de maio, o Google Street View completou sua primeira década. Esse recurso do Google Maps permite que os usuários explorem cidades em todo o mundo–e até mesmo espiem dentro de empresas e instituições de governos (incluindo a Casa Branca).

Jogos já surgiram a partir do Street View–como Geoguessr, no qual jogadores podem adivinhar onde no mundo eles estão quando são posicionados aleatoriamente–e alguns usuários coletaram imagens engraçadas capturadas pelas câmeras dos carros do Google.

Mas o Google Street View também já forneceu muito material para artistas de todos os estilos, inspirando uma gama de trabalhos criativos que inclui curadoria fotográfica, videoclipes musicais e performances improvisadas.

O que exatamente torna o Google Street View tão apelativo para essas pessoas de criatividade aflorada? Talvez ele permita que nós vivenciemos a fantasia escolar de conhecer o mundo todo.

Nunca antes as pessoas tiveram tanto acesso fácil a espaços públicos em todo o planeta e, nas últimas décadas, artistas têm exercido esse imenso poder de comentar questões que vão da vigilância ao trabalho sexual.

Curadoria do acervo imenso do Google
A pura magnitude do poder de ver tudo que o Google Street View tem é tema para alguns artistas. O projeto de Michael Wolf, “A Series of Unfortunate Events” (Uma série de eventos infelizes, em tradução livre) reúne imagens do Google Street View, indo de acidentes de bicicleta a incêndios registrados na plataforma online. Como um todo, a coleção de Wolf do vasto arquivo do Google indica a vastidão do próprio mundo. Individualmente, as suas imagens são, ao mesmo tempo, assombrosas e familiares.

Às vezes, o Google Street View instiga artistas por razões mais políticas. Pode haver um desconforto com a tecnologia, dado que ele é um dos mais abrangentes mecanismos de vigilância da história humana.

O projeto atualmente em curso de Jon Rafman, chamado “The Nine Eyes of Google Street View” (Os Nove Olhos do Google Street View, em tradução livre), reflete o relacionamento inquietante entre os humanos e a vigilância. (O número nove faz menção ao número de câmeras usadas pelo carro do Google, embora ele já tenha aumentado esse número para 15).

Em 2008, um ano depois do lançamento do Street View, o Google incorporou uma tecnologia que borra rostos das pessoas fotografadas para proteger suas identidades. Mas a tecnologia não funciona sem alguns defeitos. Uma imagem de Rafman mostra um homem em uma fantasia de coelho com o borrão ao lado da face real da pessoa desenha uma justaposição inquietante; isso é um lembrete de que o Google Street View é incapaz de diferenciar entre você alguém mascarado. Com isso, a imagem de Ralfman explora o medo mais básico em regimes de vigilância em massa: você se tornar apenas uma entidade sem rosto.

Outros artistas tiveram abordagens diferentes. Doug Rickar, em uma exposição chamada “A New American Picture” (Uma Nova Imagem Americana), documentou as ruas esquecidas da América fazendo curadoria de imagens dos moradoras de rua em seus bairros oprimidos.

Halley Docherty usou o Street View para sobrepor pinturas famosas e capas de álbuns musicais com suas configurações atuais (por exemplo, ele fez isso com a capa de um álbum dos Beatles). E o projeto “Vacated” (Desocupado) Justin Blinder transformou as imagens do Street View em gifs que se alternam entre antes de depois de fotos de esquinas nobres de Nova York.

Posando para a câmera

Há também pessoas que tentam agir inadequadamente em frente às câmeras transeuntes do Google. Embora elas não sejam artistas, elas respondem à situação com improviso artístico, criatividade e inventividade. Todos os dias as pessoas veem os carros do Google se aproximando e rapidamente reagem a ele–encenando um nascimento em Berlim ou uma morte na Escócia. Em nossa pesquisa, chamamos esses eventos performáticos de tableaux vivants (Fotos Vivas) em referência à evanescente vitalidade de cenas que veem à vida para apenas se dissolverem no momento em que acontecem.

A arte no Street View tem detratores. Mishka Henner, para seu show “No Man’s Land” (Terra de Ninguém), encontrou imagens de profissionais do sexo em ruas da Itália e da Espanha. Embora tenha sido selecionado para o prêmio Deutsche Börse Photography, também foi sujeito a análises controversas. Alguns pensaram que eram sexista assumir que as mulheres em questão eram prostitutas, embora elogiassem a maneira como as imagens comunicavam a vulnerabilidade diária (e o tédio) da vida de profissionais do sexo.

Acima de tudo talvez, a apresentação inspirou perguntas sobre a autoria dos fotógrafos que meramente fizeram a curadoria das imagens feitas pelas câmeras do Google. Não obstante, como indicou um crítico, o Google Street View nos forçou a reconsiderar o que a fotografia de rua enquanto gênero significa sob a luz das câmeras transeuntes do Google.

Qual é o próximo passado dessa estranha intersecção entre a ferramenta de mapas e arte? Hesitamos em fazer previsões, mas não nos surpreenderíamos em ver mais colaboração entre o Google e os artistas, como o vídeo experimental do Arcade Fire que mostra imagens do Google Street View de locais que marcaram a infância do telespectador em uma montagem nostálgica. Também gostaríamos de ver mais envolvimento das mulheres, uma vez que a maioria dos artistas que trabalham com o Street View tendem a ter perspectiva masculina.

Depois de uma década, o Street View não é mais novidade. Mas isso não significa que não tenha potencial artístico. Como a plataforma coleta mais e mais imagens dos espaços públicos do planeta Terra–e com realidade aumentada e virtual sendo ainda mais penetrante—, esperamos que as pessoas encontrem novas e criativas maneiras de criar arte a partir da plataforma, que, desde seu início, tem sido uma musa surpreendente.

 

Fonte: Exame 

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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