Esta empresa quer acabar com o estresse de quem tem dívidas

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O Brasil possui quase 60 milhões de pessoas com o nome negativado, segundo estudo da Serasa Experian. Apesar de esses consumidores se esforçarem para quitar dívidas, fatores como o desemprego, a falta de experiência com crédito e o hábito de fazer compras impulsivas comprometem as chances de limpar o nome.

Esse é um dado que fica mais evidente hoje, em plena crise econômica. Porém, o empreendedor Marc Lahoud já sofria com isso há muito mais tempo: tendo uma experiência de 26 anos no varejo (inclusive como empreendedor), enfrentava todos os dias clientes inadimplentes – nem mesmo contratar assessorias de cobrança resolvia sua situação.

Por isso, Lahoud resolveu atacar o problema pela raiz: criou uma plataforma para que a quitação de dívidas fosse mais simples tanto para o usuário quanto para a empresa. Com menos de dois anos de negócio, a QueroQuitar! possui 1,3 milhão de CPFs cadastrados e já faz parcerias com empresas como Bradesco e Vivo.

Percepção da demanda

Como Lahoud não conseguia recuperar seu dinheiro, mesmo com assessorias de cobrança no pé de seus clientes inadimplentes, ele resolveu pesquisar mais a fundo o tema.

O interesse foi tanto que, no ano de 2014, o empreendedor pensou em criar um negócio que tivesse como missão resolver o problema de consumidores negativados – indo além dos que se relacionavam apenas com seu próprio negócio no varejo.

“Entendi que não poderia estruturar a minha empresa sem ter uma visão especializada. Por isso, chamei um especialista em recuperação para ser co-fundador, o Alen Castro. Ele mostrou como era a dinâmica de assessoria de cobrança e de recuperação de crédito, justamente para modelarmos nosso negócio”, conta Lahoud.

Depois, o negócio também incorporou um co-fundador especializado em tecnologia, Rafael Miranda, para elaborar a plataforma da QueroQuitar!. Por fim, o co-fundador Artur Zular é psicólogo e cuida da área de comportamento humano dentro da startup.

Enquanto buscava sócios, também havia um estudo sobre o mercado em que o negócio queria atuar. O número de pessoas com nome sujo era de 32 milhões em 2014 – e, como vimos no começo da matéria, ele só aumentou.

“Construímos um modelo já prevendo uma alta inadimplência no futuro, que fez parte da nossa pesquisa para o modelo de negócios. Sabíamos que a situação de crédito acabaria degringolando, com o acesso fácil a crédito de forma não sustentável no Brasil”, diz Lahoud.

No mesmo estudo, a startup identificou três pontos de atrito na relação tradicional do consumidor com sua dívida. “Primeiro, ele tem constrangimento em falar com seu credor, que é a própria empresa para a qual ele deve; segundo, ele acha invasivo o contato insistente de quem lhe cobra a dívida; e, por fim, ele não se relaciona bem com quem o negativa – a Serasa ou o SPC, por exemplo. Ele evita esses canais a todo custo, porque são eles que criam a dor nele.”

Segundo Lahoud, a ideia da QueroQuitar! é recuperar esse consumidor negativado de volta para o consumo – incluindo o consumo com a empresa para a qual ele deve. Afinal, se temos 60 milhões de consumidores negativados no país, não é tão simples para um negócio cortar relações com toda essa parcela devedora da população.

“Temos condições de fazer um bom acordo e devolver essa pessoa para um consumo mais sustentável. Queremos transformar esse ciclo vicioso e agressivo de atendimento e cobrança, que só atrapalha a resolução de dívidas, em um ciclo virtuoso.”

Isso se dá por meio de uma mudança na relação de poder: com a QueroQuitar!, o poder de decisão está mais focado no usuário do que no cobrador da dívida, diz Lahoud. “Para a geração Y, aquele modelo tradicional de ligações repetidas de cobrança não funciona mais.”

Em setembro de 2014, a plataforma foi finalmente lançada. Ela funciona apenas na versão desktop, com um site adaptado para acesso por smartphones (o chamado “site responsivo”).

Como funciona?

A QueroQuitar! é um marketplace que reúne diversas empresas que contratam os serviços da startup. Na plataforma, esses credores colocam suas carteiras de crédito a serem recuperadas; ao mesmo tempo, a QueroQuitar! convida os consumidores com restrição de crédito a negociarem, por meio da plataforma, com a empresa para a qual devem.

“Nosso grande diferencial é que esse usuário pode localizar seu débito quando e onde quiser, fazendo uma proposta de negociação por meio da própria plataforma. Fica disponível 24/7, não tem intervenção humana e nem constrangimento. A pessoa pode resolver sua situação sem precisar contar para ninguém.”

Quando o devedor entra na QueroQuitar!, já há uma proposta de negociação que a startup negociou com a empresa que contratou os serviços. Ele pode aceitar tal proposta ou então sugerir uma contra-proposta. Assim, devedor e credor podem conversar sem intermediários.

Se os dois chegarem a um acordo, a própria plataforma da QueroQuitar! gera um boleto na conta do credor. Por lei, depois de cinco dias úteis após o pagamento de primeira parcela, a empresa credora deve tirar o nome do devedor da lista da Serasa e do SPC. Se ele tiver mais de uma dívida, a cada acordo concretizado seu nome vai ficando mais limpo.

Segundo o Lahoud, é possível que as condições de pagamento da dívida sejam melhores do que as negociadas pelo modelo tradicional de cobrança. “Como o próprio usuário constrói a solução, ele só faz o acordo se este couber no bolso. É mais sustentável do que o cobrador ligando para ele e insistindo: muitos aceitam as condições apenas para se livrar da insistência. O consumidor consegue conquistar um desconto, já que há um processo de ir casando possibilidades em negociações pela plataforma.”

A QueroQuitar! se monetiza por meio da cobrança de uma taxa (não divulgada) sobre o que foi efetivamente recebido pela empresa credora.
“Todo mundo perde quando o acordo não é cumprido: o devedor não limpa seu nome e tanto a empresa quanto nós não recebemos. Por isso, fazemos um trabalho de acompanhamento de pagamento, para não deixar o usuário se desmotivar. Trabalhamos na educação financeira, com conteúdo, e também o incentivamos a cada parcela quitada.”

Além de as empresas requisitarem o serviço da QueroQuitar!, o usuário também pode preencher um formulário dizendo quanto deve, a quem deve e como quer pagar: a startup tentará entrar em contato com a empresa credora, convidando-a a negociar pela plataforma. Do lado da iniciativa dos credores, o valor de dívidas cadastradas passa de 1,6 bilhão de reais; do lado dos devedores, há 70 milhões de reais. Há oito empresas já operando na plataforma (incluindo as parcerias com Bradesco e Vivo), e mais dez estão em espera.

Reconhecimentos e parcerias

No começo de 2015, alguns meses depois de seu lançamento, a QueroQuitar! foi aprovada no Inovabra, programa de inovação aberta do banco Bradesco.

“Ficamos praticamente um ano lá, conhecendo mais de processos na área de finanças, jurídica e de segurança. Inclusive, passamos por testes de invasão para testar a proteção de dados da plataforma. No fim, concluiu-se que era um site seguro para atender clientes do Bradesco, e estamos lá até hoje”, explica Lahoud.

Ou seja: além da área offline de cobrança, o banco também sugere aos clientes a negociação por meio da QueroQuitar!, como uma outra forma de a instituição financeira recuperar crédito. “É uma disrupção no modelo de negócios no setor, e é algo que imaginamos desde o começo da empresa.”

Em maio do mesmo ano, a QueroQuitar! começou seu processo de aceleração na Wayra, local de fomento ao empreendedorismo criado pela Telefônica/Vivo, conciliando a estadia na aceleradora e no Bradesco. Em outubro de 2015, a startup recebeu seu primeiro investimento, do fundo do Vale do Silício 500 startups.

Este ano, a startup foi eleita a melhor startup financeira participante do CIAB Febraban 2016, congresso organizado pela Federação Brasileira de Bancos.

A ideia da QueroQuitar! é chegar a cinco milhões de CPFs cadastrados até o final de 2017. A startup também conta que começa a pensar em uma nova rodada de aportes. Segundo Lahoud, nos próximos meses a startup negociará com fundos um investimento de Série A.

Fonte: Exame

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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