Crédito mais caro e escasso deve afetar investimentos e frear economia

O cenário econômico adverso que o governo enfrentará este ano ganhou no penúltimo dia de 2014 mais um elemento complicador: o próprio governo cortou em 10,4% a estimativa de receitas disponíveis para as empresas estatais para este ano. O motivo, segundo o Ministério do Planejamento, foi uma “menor previsão de captação pelos bancos”. Os recursos vão escassear, informou, por causa da anunciada decisão federal de reduzir os aportes do Tesouro Nacional no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). E isso deve significar, no final das contas, menos investimentos.

Os números mostram que uma grande prejudicada com esse processo será a Eletrobrás, que terá uma redução de recursos de 14,7% em razão da queda nos financiamentos. Com isso, gastará 6,7% abaixo do ano passado, embora a holding e suas controladas sejam sócias de empreendimentos importantes em construção.

O dado confirma a intenção do governo de desidratar a ação do BNDES a partir deste ano, como anunciou o novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, assim que foi confirmado no posto. As outras estatais também não escaparão do cenário de crédito escasso, além de mais caro. Em meados de dezembro, o governo elevou a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), de 5% para 5,5%, após dois anos de estabilidade. E novos aumentos virão.

Essa deverá ser uma dificuldade a mais para o já complexo quadro econômico em 2015. Os investimentos terão dificuldade de desempenhar seu papel de puxar o Produto Interno Bruto (PIB), como pregou a presidente Dilma Rousseff, em seu discurso de posse, no Congresso. A presidente também apontou o ajuste nas contas públicas, o aumento da poupança interna e a elevação da produtividade como fatores mais relevantes para o País voltar a crescer.

Na solenidade, dias após tornar mais rígidas as concessões de benefícios previdenciários e trabalhistas, Dilma falou em fazer o “menor sacrifício possível” na tentativa de reanimar o PIB. Levy foi mais duro ao pregar que será preciso “coragem” para “fazer o que for necessário”. Na mesma linha, o novo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, admitiu “correções aqui e ali” para fazer a economia crescer “rapidamente”.

Fora do governo, a avaliação é dura sobre a taxa de investimentos. “Tem uma ligeira melhora, que nem de longe devolverá a queda de 2014”, avalia o economista Rafael Bacciotti, da consultoria Tendências. Para 2014, ele estima uma redução de 7,7% na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), principal medida nessa área, além de expansão de apenas 1,1% em 2015. “Mas já tem agentes de mercado projetando nova queda.”

Essa dificuldade já se colocava antes mesmo de surgir um complicador ainda maior: a Operação Lava Jato, da Polícia Federal, que colocou na mira da investigação dois dos principais motores do investimento no País: a Petrobrás e as grandes construtoras privadas.

A perspectiva de desaceleração ou paralisia dos projetos dessas empresas, provocada até pelo risco de falta de novos empréstimos, assombra o governo. “Essas obras não podem parar”, disse um interlocutor de Dilma. “Seria o caos, e o Brasil é grande demais para cair no abismo.”

Blindagem

Por isso, o governo tratou de construir uma blindagem jurídica para garantir, ao menos por enquanto, a continuidade dos financiamentos a esses grandes projetos. Consultada pelo BNDES, a Advocacia-Geral da União (AGU) emitiu um parecer garantindo que as investigações da PF não impedem as empresas acusadas de obter empréstimos, assinar contratos ou mesmo participar de novas licitações. “Do contrário, estaríamos antecipando uma punição que nem sabemos se haverá”, explicou um auxiliar graduado da presidente Dilma.

O que não quer dizer que os bancos dispensarão o rigor na análise de crédito. Pelo contrário, a AGU já recomendou cautela redobrada às instituições financeiras.

A blindagem também protege as concessões de aeroportos e rodovias realizadas em 2013 e 2014, que não seriam afetadas por eventuais punições às construtoras. Isso porque os empreendimentos são controlados por sociedades de propósito específico (SPEs), das quais esses grupos são apenas sócios.

Levy defende, desde sua passagem anterior pelo governo, o fortalecimento do mercado de capitais, que daria às empresas brasileiras alternativas de financiamento para além do sistema bancário. Esse ponto foi reafirmado por Dilma no discurso de posse. Mas esse é um processo que depende de um produto escasso no momento: regras entendidas como claras e estáveis, que permitam a retomada da confiança empresarial. 

AJUSTES ANUNCIADOS 

TJLP

Será de 5,5% ao ano no primeiro trimestre de 2015. Primeira elevação da taxa desde outubro de 2003, no início do governo Lula. Até 2014, a taxa era 5% ao ano.

PSI

A taxa final ao tomador do PSI aumentou para entre 6,5% e 10% ao ano. O porcentual de financiamento dos bens dessa linha criada na crise de 2009 caiu de até 100% para 70%. 

Salário mínimo

Dilma definiu o valor de R$ 788 a partir deste mês, reajuste de 8,84%. Ao aprovar o relatório final da Lei Orçamentária para 2015, o Congresso havia definido um salário mínimo de R$ 790. 

Abono salarial

Antes, bastava trabalhar 1 mês no ano e receber até 2 salários mínimos para ter direito a um salário. Agora, é preciso trabalhar 6 meses e o pagamento será proporcional. 

Seguro-desemprego

Carência passa a ser de 18 meses na primeira solicitação, 12 meses na segunda e 6 meses a partir da terceira. 

Pensão por morte

É preciso que o falecido tenha contribuído com a Previdência no mínimo por 2 anos e a comprovação de 2 anos de casamento ou união estável. O valor do benefício muda de acordo com o número de dependentes e o prazo de pagamento varia com a idade. 

Auxílio-doença

O teto do benefício será a média das 12 últimas contribuições e as empresas passam a arcar com o custo de 30 dias de salário antes do INSS. 

Seguro-defeso

É preciso exercer a atividade de forma exclusiva e ter registro de pescador há, no mínimo, três anos.

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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