Antropólogo compara situação dos índios no Brasil à Faixa de Gaza

“Quantos nomes de grupos indígenas você conseguiria pronunciar de memória? A imprensa brasileira consegue pronunciar pouquíssimos”, afirma o antropólogo Beto Ricardo. Ele e Eduardo Viveiros de Castro fizeram críticas à situação dos povos indígenas no Brasil na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip).

“Os índios estão mais visíveis que nunca e mais vulneráveis que nunca. É um momento muito difícil para os povos indígenas”, diz Viveiros de Castro. O antropólogo acredita na existência de uma campanha atual para revogar as conquistas dos índios em 1988, quando ocuparam o Congresso para exigir que suas reivindicações fossem incluídas na Constituição.

Para Viveiros de Castro, a construção da usina de Belo Monte é “uma picaretagem em termos econômicos” e o Congresso tem uma maioria de grandes proprietários, o que dificulta a defesa de direitos de grupos minoritários.

Quanto à situação dos povos indígenas, acredita que “é uma espécie de Faixa de Gaza brasileira”. “Eles foram sendo pouco a pouco empurrados, encurralados, como o povo palestino”, afirma.

Esta é a segunda mesa dedicada aos índios e à antropologia brasileira nesta edição da Flip. Nesta sexta-feira, a fotógrafa Claudia Andujar esteve presente em debate com o líder yanomami Davi Kopenawa, que falou sobre o mito do “desabamento do céu”, que seria a destruição dos homens em consequência de suas próprias ações de degradação.

Questionado sobre o assunto, Viveiros de Castro respondeu que “talvez só os índios sobrevivam, mostrando que é possível viver num mundo sem televisão a plasma e computador”.

Durante as mesas da Flip, as pessoas da plateia podem participar com perguntas aos convidados. Uma dessas perguntas questionou a existência de “bêbados que se autoafirmam índios”, causando exclamações de outras pessoas da plateia.

Viveiros de Castro lembrou, em resposta à pergunta, que “33% do nosso genoma vem do estupro de indígenas”. Beto Ricardo lembra que ser índio não é sinônimo de vestir um determinado tipo de roupa. Ele considera esse preconceito tão “patético” quanto dizer que o cidadão que consegue sua cidadania italiana deixa de ser brasileiro. “Há uma patrulha em cima dos índios. Quando eles escapam desse estereótipo, eles são condenados”, afirma.

Beto Ricardo

É antropólogo brasileiro e um dos fundadores do Instituto Socioambiental, onde coordena o programa Rio Negro, de incentivo à responsabilidade socioambiental e ao desenvolvimento sustentável da bacia do rio Negro, na Amazônia. Participou da fundação da Comissão para a Criação do Parque Yanomami (CCPY), em 1974. Publicou trabalhos como “Atlas – Amazônia sob pressão” (2012). Por sua atuação, recebeu em 1992 o Prêmio Ambientalista Goldman.

Eduardo Viveiros de Castro

É antropólogo brasileiro e professor do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. É autor da coletânea de ensaios “A inconstância da alma selvagem” (2002). Realizou pesquisas entre os Yawalapíti do Parque do Xingu (MT) e os Araweté do Médio Xingu (PA). Publicou diversos artigos e livros sobre a antropologia brasileira e a etnologia americanista, como “Amazônia: etnologia e história indígena”.

 

 

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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