‘Acabei expondo a minha família’, diz André Vargas

Pressionado pelos próprios colegas de partido a desistir de seu mandato na Câmara dos Deputados, André Vargas (PT-PR) renunciará ao cargo nesta terça-feira (15). Ele explicou à Folha que a questão familiar foi determinante na decisão pela renúncia e não querer ser tratado como ‘sócio de doleiro’.

Vargas caiu em desgraça após a revelação de suas ligações com o doleiro Alberto Youssef, pivô da Operação Lava Jato. A crise teve início quando a Folha noticiou que o petista usou um jato cedido pelo doleiro para passar férias com a família no Nordeste.

Desde o início da crise, Vargas se licenciou do mandato por 60 dias e, depois, anunciou a renúncia ao cargo de vice-presidente da Câmara.

Folha de S. Paulo – Que relação o sr. teve com o doleiro Alberto Youssef?
André Vargas – O juiz Sérgio Mouro é muito claro. Disse que eu não tenho nenhuma relação com as investigações em relação à Petrobras, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, etc. Ele localiza a minha relação segundo à Labogem. Então eu quero responder por isso e não ficar respondendo no Brasil inteiro por todas as investigações do Alberto Youssef sobre as quais não tenho conhecimento.

Que orientação o sr. deu a Youssef?
Disse que caminho tinha que seguir. O caminho normal que qualquer um deveria seguir. Me interessei pelo projeto, achei que era bom para o país, era bom para a economia. Mas, volto a dizer: nunca pedi nenhum favor nem advoguei para o Youssef.

Ele pediu algum favor ao sr.?
Não. Ele reclamava que as coisas estavam demorando demais, e eu dizia que as coisas são assim mesmo.

Desde quando o sr. o conhece?
Há mais de 20 anos.

Tem relação de amizade?
Não chamaria de amizade. Amizade é uma palavra sagrada, né. Tinha uma relação fortuita, de quem discutia política, economia. Ele é um empresário da minha cidade! Se eu entendesse que ele estava cometendo algum crime, não teria conversado com ele. Eu estava tratando de um projeto importante. Se ele estava cometendo um crime, eu não tenho responsabilidade sobre isso.

Frequentavam eventos sociais juntos?
Nunca fomos juntos, mas nos encontrávamos na cidade.

Por que a renúncia agora e não na semana passada, quando o sr. tinha chance de evitar cassação?
Recebi um apelo familiar. Eu não fui nem notificado nem intimado por nenhum processo judicial. O relator já fez juízo de valor, já disse que tem provas. Precipitado dizer que meus encontros eram criminosos. Mas, na opinião pública, eu já fui julgado e condenado. Tenho família, filhos pequenos.

O PT pressionou para o sr. renunciar. Essa decisão de hoje leva em conta essa pressão?
Eu tive muita solidariedade de muitos companheiros, mas o PT tem muitas divisões e tendências. Realmente o apoio não foi unânime. Tomei a decisão pela minha família e também para preservar o partido. Esse caso rumoroso surge no meio da eleição e o relator [deputado Julio Delgado (PSB-MG)] já disse que a cassação interessa ao candidato à Presidência da República deles, o Eduardo Campos.

Lula disse que o PT não poderia pagar o pato. O sr. se sente isolado?
Ele disse, corretamente, que eu precisava me explicar. Mas eu cometi um equívoco, que não foi partidário, de me relacionar com uma pessoa que cometia crimes. Entendo que essa questão seria usada para atacar os nossos candidatos. E eu serviria de saco de pancada para atingir os nossos candidatos.

Mas ele parece ter feito doações para partidos.
Não tenho absolutamente nada a ver com isso. Não recebi nenhuma doação de campanha dele.

O sr. é um dos líderes do “volta, Lula”.
Nunca defendi isso. Nem acho possível.

No Palácio do Planalto o sr. é visto como tal.
Nunca ninguém de lá me disse isso.

Colegas seus relataram conversas dizendo que o sr. chegou a desconfiar que o Planalto estivesse por trás dos vazamentos.
Essas fontes estão faltando com a verdade. Lamento que tenha vazamento seletivo do processo, e isso é crime. O que tem contra mim até o momento são 10 ou 12 mensagens entre 12 mil de todo o processo.

O sr. sabe de outras pessoas que se relacionavam com ele?
Isso compete a quem faz a boa investigação aí na imprensa.

A “Veja” atribuiu ao sr. declarações contra o ex-ministro Alexandre Padilha, Paulo Bernardo, Gleisi Hoffmann
Não posso responder porque não são verdadeiras. Tenho a melhor relação com o Paulo Bernardo e com a Gleisi [Hoffmann]. Não será esta ou aquela revista que vai me jogar contra eles. São pessoas corretas. Eu não falaria isso. Só posso falar daquilo que sei, e eu não sei. O Paulo e a Gleisi são as duas maiores lideranças do partido, são referência nossa.

Por que a renúncia agora se ela não salva seu mandato?
Porque não estou preocupado com meu mandato, estou preocupado com as minhas crianças (Vargas chora). Até o momento não tive direito de defesa, e não teria na comissão de ética do jeito que está formada. A representação na comissão de ética não tem nenhum prova, só matérias de jornal. O Valdemar da Costa Neto teve seu processo sustado porque se baseava em jornais. Outros deputados tiveram seus processos remetidos para a corregedoria para fazer uma avaliação prévia. E meu destino foi decidido por três partidos de oposição.

O sr. se sente injustiçado.
Me sinto. Só o tempo agora. Vou provar na justiça. Eu não posso ficar na imprensa sendo tratado como sócio de doleiro, que eu não sou.

O sr. teme novas acusações?
São 12 mil gravações. Tem muita gente lá. Tem muito empresário e a imprensa não trata as pessoas como supostamente envolvidas, como no meu caso.

E que outras pessoas são essas?
Eu não sou desses.

Desses o quê? Dedo duro?
É. Quem teve acesso aos meus [diálogos], teve acesso a tudo.

Tem gente sendo protegida?
Não acho isso. Reconheço que sou vice-presidente da Câmara e entendo que deveria ter sido mais prevenido. Nunca deixei de defender meus companheiros [volta a se emocionar].

Mas seus companheiros deixaram de defendê-lo.
Os verdadeiros estão aí comigo na trincheira. Vou seguir minha vida. Responder.

O sr. se ressente de ter sido de defensor de muitos companheiros
Não. É seguir adiante e ser mais prevenido. Na política, somos muito vulneráveis. Eu estou sendo julgado por um encontro fortuito com um empresário dono do maior hotel da minha cidade. Por ter me interessado pelo projeto dele, projeto que me parecia adequado. Tive uma relação com uma pessoa que era tratada como testemunha pelo Ministério Público e que foi redimido pela justiça.

Mas o sr. não sabia que ele era doleiro. Ele virou testemunha justamente porque era doleiro.
Ele tinha sido e foi redimido pela justiça. Se ele voltou a cometer os crimes, não posso responder por isso. Minha renúncia vai deixar claro o que é a operação Lava Jato.

Como assim?
Vai ficar claro que eu não tenho nada a ver com isso. Eu já li as oito mil páginas, e o que vi de destaque até hoje foi um jatinho e um projeto da Labogen que acabou por não acontecer. Quem tiver preocupação de ler vai ver se isso é mais importante ou não.

O sr. está sugerindo que tem coisas mais importantes ali.
Não estou sugerindo nada. Só acho que tem que ler. Deve ter muito mais apreensão, muito mais documento.

Novas fases da operação?
Não acho nada.

O sr. está falando como se soubesse de mais coisas. Quero entender o que o sr. sabe.
Só oriento o bom jornalista a ler. Ler detidamente. Acho que vai ser interessante para poder tirar o perfil de qual era a atuação do Alberto Youssef. Eu só descobri lendo. Realmente não tinha noção. Não me relacionei com essa pessoa, me relacionei com um empresário da minha cidade que tinha um projeto interessante da Labogen.

O sr. conhece o Paulo Roberto, da Petrobras?
Lógico que conheço, era diretor lá. Encontrei com ele em Londrina também. Mas não tinha relação. Não tem meu nome lá.

O sr. vai fazer campanha pela Dilma?
Queria passar um recado para a minha militância. A gente vai se manter firme. Outras lideranças vão surgir e todos nós vamos estar na campanha da Dilma e da Gleisi.

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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