Marina deve assumir os compromissos de Campos, diz sociólogo

Escolhida pelo PSB para disputar a Presidência, Marina Silva terá de “encarnar” compromissos de Eduardo Campos, candidato da sigla morto na quarta-feira (13) num acidente aéreo.

A avaliação é do sociólogo Luiz Werneck Vianna. Para ele, Marina precisa manter os compromissos do ex-governador de Pernambuco para ter apoio dos empresários.

“[Ela pode] dizer que a candidatura original era dele, que eles conceberam a candidatura juntos e agora tem que se fiar mais às convicções dele do que particularmente às dela”, afirmou o sociólogo na sexta-feira (15).
Segundo Vianna, Marina pode atrair os votos dos indecisos e do eleitorado descrente com a classe política.

Rony Maltz/Folhapress
O cientista político Luiz Werneck Vianna sobre o cenário político após a morte de Eduardo Campos, na PUC-RJ
O cientista político Luiz Werneck Vianna sobre o cenário político após a morte de Campos, na PUC-RJ

Folha – Que impacto essa tragédia pode ter na eleição?

Luiz Werneck Vianna – Mudou tudo. Para onde, não se sabe.

Com o nome de Marina confirmado, que cenário o sr. vê?

Ela tem problemas no PSB, tem problemas em setores empresariais, é bem aceita nas camadas médias, como ficou provado em 2010.

Campos era bem aceito pelo empresariado. Acha que ela pode herdar essa aceitação?

Ela vai ter que encarnar o Eduardo Campos. Tem inclusive uma saída honesta para essa encarnação: dizer que a candidatura original era dele, que eles conceberam a candidatura juntos e agora ela tem que se fiar mais às convicções dele do que particularmente às dela. Esse é o maior desafio.

Que outros desafios ela tem?

Demonstrar para a população que [essa encarnação] é verdadeira.

Em 2010 o vice dela era o empresário Guilherme Leal. Não é suficiente para ter aceitação?

Era um nicho empresarial. Não há como imaginar nesta altura que o agronegócio vá escolher o nome dela.

O sr. vê possibilidade de Marina compor com o agronegócio, como fez Campos?

Se ela se convencer e convencer o grande público de que ela não é uma persona singular, mas sim complexa -ela é o legado de Campos-, aí é possível.

A comoção pelo episódio tem impacto [na intenção de voto para Marina]?

Vai ter, mas o problema é saber para que direção. O maior impacto de morte que já ocorreu foi o suicídio de Vargas: em 24 horas mudou o país. Para saber para qual direção haverá impacto, é melhor procurar um mago.

A candidatura de Marina tira mais votos de quem?

Ela pode provocar uma atração forte sobre os indecisos, o pessoal do “não me representa”.

Do movimento das ruas?

Não digo o movimento das ruas, mas algo dessa cultura que vicejou ali pode encontrar expressividade nela, algo que Campos não tinha conseguido. Eduardo era muito terno e gravata, a pauta dele era responsável: economia, desenvolvimento… A pauta da Marina, como ela mesma diz, é “sonhática”.

Atualmente, a candidata que está na frente é a Dilma.

Ela não tem luz própria. Não conseguiu ao longo do governo. Deixou que a presença do outro [Lula] ficasse muito visível no Gilberto Carvalho, Mercadante, Berzoini. Os homens e as mulheres da Dilma são quais? Com quem ela conversa abertamente? É uma solidão política imensa.

Qual é o impacto da morte de Campos sobre a política?

É ruim. Uma liderança jovem. O regime militar não favoreceu o surgimento de lideranças novas. Mas PT e PSDB também não favoreceram. Os quadros diretivos dos dois partidos são homens para além da meia idade. Esses dois partidos se comportaram como uma oligarquia. Principalmente o PT. O monopólio da política ficou restrito ao presidente da República e ao entorno imediato.

Campos conseguiu se descolar desse problema?

De certo modo sim, mas ele tinha o aval do avô [Miguel Arraes, ex-governador de Pernambuco], que abriu a política para ele.

E a Marina?

Ela tem uma trajetória de aventura singular, história de vida particular.

Essa falta de nomes novos preocupa para 2018?

Sim, porque o nome falado para 2018 pelo PT qual é? É o Lula. Não tem quadro novo.

O PT tenta renovar com Haddad, Padilha, Lindbergh…

Haddad era um novo quadro sem luz própria. A emergência de quadros novos é a partir de luz própria, e não vinda de um poste. Padilha não tem. Lindbergh se projetou individualmente. O PT tem vida orgânica? Não tem. Sem isso os quadros não são selecionados. O PSDB também não tem vida orgânica.

RAIO-X LUIZ WERNECK VIANNA

IDADE 76

FORMAÇÃO Sociólogo, mestre em ciência política pelo Iuperj e doutor em sociologia pela USP

ATUAÇÃO É professor-pesquisador da PUC-Rio

LIVROS “Liberalismo e sindicato no Brasil” (1976); “Esquerda brasileira e a tradição republicana: estudos de conjuntura sobre a era FHC-Lula” (2006); “A judicialização da política e das relações sociais no Brasil”, com Maria Alice de Carvalho, Manuel Palacios Cunha Melo e Marcelo Baumann Burgos (1999)

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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