A força-tarefa em prol dos animais, que começou em fevereiro, também tem a participação da Frente Nacional de Defesa dos Jumentos e voluntários de instituições como USP (Universidade de São Paulo), UFBA (Universidade Federal da Bahia) e UFAL (Universidade Federal de Alagoas).
Medicaram, alimentaram e realizaram pequenos procedimentos cirúrgicos nos animais, desde correção de casco até castração. Três pessoas, entre elas uma veterinária, ficaram encarregadas dos cuidados diários. A Adab (Agência Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia) também auxiliou no controle de zoonoses.
Gastam em torno de R$ 25 mil por mês com os animais, segundo o Fórum, dinheiro que arrecadam por meio de doações e vaquinhas online. Também fizeram parceria com uma ONG internacional focada em jumentos.
Apenas em outubro puderam ser transferidos para uma nova fazenda, próxima à anterior. Segundo Vania Nunes, diretora técnica do Fórum, a mudança demorou porque era preciso garantir que os animais não estavam contaminados com anemia infecciosa e mormo. Os infectados tiveram que ser sacrificados.
O desafio agora é conseguir um novo lugar para os jumentos que ainda estão sob os cuidados do grupo. Um dos obstáculos é a dificuldade de transferir os animais para outro lugar, checar se as propriedades dos interessados são adequadas e acompanhar o processo de adoção depois —especialmente porque querem evitar que sejam abatidos.
O abandono de jumentos é comum no Nordeste, seja porque ficaram velhos e perderam a função na roça ou porque foram trocados por motos ou equipamentos mais modernos. Acabam soltos nas ruas, correndo o risco de causar acidentes na estrada e transmitir zoonoses, ou encaminhados para o abate.
O abate de equídeos é permitido por lei no Brasil desde 1984 para fins industriais e comerciais. A prática mobiliza setores de defesa dos animais e levou à elaboração de um projeto de lei que tenta proibi-la, que está em tramitação na Câmara.
A pele do animal é uma das partes mais cobiçadas pela China por causa de uma gelatina que contém, usada para fazer o ejiao, medicamento da medicina tradicional chinesa que promete, entre outras coisas, combater o envelhecimento, aumentar a libido e regular a menstruação de quem o ingere.
De janeiro a outubro deste ano, foram exportadas 2.117 toneladas de carne de equídeos, que renderam US$ 4,9 milhões (mais de R$ 21 milhões), de acordo com dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Rússia e o Vietnã lideram a importação de carne de equídeos do Brasil (em peso e valores).
Já a exportação de pele chegou a 53 toneladas e rendeu US$ 129.441 (cerca de R$ 550 mil). Não foram informados os países que mais importam.
Para controlar a população do mamífero e desenvolver o agronegócio, o governo da Bahia, por meio da Adab, regulamentou em 2016 o abate de equídeos.
O objetivo era exportar a pele para a China e doar a carne para um zoológico e para virar ração (a portaria do governo diz que a carne não deve ser destinada a consumo humano por não fazer parte da cultura dos brasileiros).
Na ocasião, afirmaram que se tratava de solução “humanitária e ética” para o problema dos animais errantes.
Hoje, há três frigoríficos na Bahia que fazem o abate de equídeos: um de equinos (cavalo e égua) e outros dois de asininos (jumento e jumenta), segundo o Ministério.
Além da polêmica em Euclides da Cunha, uma fazenda em Itapetinga (interior do estado) de uma empresa chinesa havia sido interditada meses antes após denúncias de maus-tratos a jumentos.
O episódio mobilizou advogados e veterinários, que conseguiram em dezembro de 2018 uma liminar da Justiça Federal para proibir o abate de jumentos na Bahia. A liminar, contudo, foi suspensa em setembro deste ano pelo Tribunal Regional Federal.
Nunes critica a liberação do abate e se articula para reverter a decisão. Na terça (3), participará de uma audiência pública na Câmara dos Deputados para debater a questão.
“A gente espera que o trabalho seja exemplar para que os jumentos nordestinos sejam tratados com respeito e dignidade”, diz. “Não é possível que um animal tão reverenciado se transforme em material descartável.”
Entenda as diferenças
Jumenta e jumento
Também conhecidos como jegue ou asno, são da espécie dos asininos. Mais peludos, têm orelhas maiores e são mais baixos do que a mula ou o burro
Mula e burro
Animais estéreis e híbridos, são fruto do cruzamento entre o jumento e a égua. Têm o pelo baixo como o do cavalo
Bardoto
É fruto do cruzamento entre a jumenta e o cavalo e também é estéril. O mesmo nome é usado para macho e fêmea
Égua e cavalo
Equinos, têm pescoço mais alongado e formato da cabeça mais bem definido do que os outros.