A economia precisa de motores novos, diz Tombini

Em seu primeiro discurso como presidente do Banco Central (BC), em janeiro de 2011, o economista Alexandre Tombini afirmou que a meta de inflação do Brasil, de 4,5% ao ano, poderia ser reduzida. Ele não deu prazo para isso acontecer nem disse qual seria o novo número: só indicou que o país deveria ter a “ambição” de ter uma inflação anual inferior a 4,5%, como ocorria em outros mercados emergentes. “O crescimento sustentado”, disse ele, “só pode ser atingido com inflação baixa.”

Três anos depois, estamos ainda mais longe de atingir esse objetivo. Aliás, hoje, chegar aos 4,5% já seria ótimo. O que deu errado? Parte da culpa é da desvalorização do real, algo que Tombini considera esperado em razão das mudanças na política econômica americana.

Mas, em entrevista a EXAME, ele também afirmou que o país precisa encontrar novas fontes de expansão da economia e investir para aumentar a produtividade, para que mais crescimento não gere mais inflação. “Crescimento gerado apenas pela absorção de mão de obra tem um limite”, disse. A seguir, os principais trechos da entrevista.

EXAME – A economia brasileira está numa fase difícil. O PIB está crescendo menos, a inflação está acima da meta, os juros subiram, voltamos a ter déficit nas contas externas. O que não saiu como o planejado?

Alexandre Tombini – De fato, a economia desacelerou, mas estamos conseguindo gerar empregos. O desemprego é um fantasma que ronda muitas economias, mesmo algumas que estão crescendo, e não padecemos disso aqui.  Também estamos avançando no processo de redução das desigualdades sociais. Não devemos confundir instrumentos do Banco Central com resultados econômicos.

Os juros estão subindo porque precisamos enfrentar a inflação e navegar nesse novo cenário externo, de diminuição da liquidez global. Esse é um instrumento de política monetária que tem de ser usado quando necessário, e está sendo usado. Sobre o balanço externo, a pergunta que temos de fazer é: o déficit é financiável em meio a um ambiente internacional que está mudando? E ele é, sim.

Quase 80% do déficit em 2013 foi financiado por investimentos estrangeiros diretos. Nossos dados mostram que começamos bem este ano, atraindo investimentos. Além disso, o Brasil tem uma excelente oportunidade: aproveitar a esperada recuperação da economia mundial e do comércio externo e exportar mais. Hoje, o déficit em conta-corrente não tira o sono do Banco Central.

EXAME – E o que tira o sono do BC?

Alexandre Tombini – Temos de encontrar “novos motores”, novas fontes de expansão da economia. Crescimento gerado apenas pela absorção de mão de obra tem um limite. Nesse sentido, a agenda do governo está bem focada. Precisamos qualificar a mão de obra, e temos mais pessoas estudando e mais programas públicos de qualificação que atendem milhões de trabalhadores.

Também precisamos destravar o investimento e resolver os gargalos de infraestrutura para ampliar nossa capacidade de crescer sem pressionar a inflação. Podemos enxergar este momento como uma oportunidade de nos ajustar e aumentar a produtividade da economia.

EXAME – Quando o senhor assumiu o BC, em 2011, afirmou que a meta de inflação poderia ser reduzida. Mas a inflação aumentou. O que deu errado?

Alexandre Tombini – Ao mesmo tempo em que estamos com nossa política para chegar ao objetivo de inflação, tivemos uma expressiva desvalorização do real. Em certa medida, isso é positivo, porque balanceia a economia e deixa o setor produtivo mais competitivo.

Mas, obviamente, uma desvalorização nominal de 55%, como a que tivemos nos últimos três anos, tem um impacto na condução da política de estabilidade de preços. Temos respondido ao desafio de manter a inflação sob controle e trazê-la para mais perto da meta, de 4,5%, e estabilizá-la em torno desse valor.

EXAME – Há uma previsão de quando a inflação atingirá a meta de 4,5%?

Alexandre Tombini – Nosso objetivo é sempre 4,5%. Até que o Conselho Monetário Nacional estabeleça novo valor.

EXAME – O que é preciso fazer para chegar a esse percentual de 4,5%?

Alexandre Tombini – O Banco Central vai ajustar seus instrumentos para trazer a inflação para baixo e mantê-la sob controle. Mas dependemos do cenário externo.

EXAME – Um ajuste fiscal mais incisivo não poderia contribuir?

Alexandre Tombini – A política fiscal ajuda a assegurar a estabilidade macroeconômica. E a presidente Dilma Rousseff disse recentemente que a meta fiscal para 2014 é consistente com o declínio do endividamento do setor público em relação ao tamanho da economia.

EXAME – Está escrito na última ata do Copom que preocupações com a questão fiscal contribuíram para elevar os juros nos mercados futuros.

Alexandre Tombini – Minha resposta sobre o tema sempre é a seguinte: quanto maior o esforço fiscal, melhor. Mas quem define isso é o governo. Os objetivos fiscais dos últimos anos, na média, ajudaram a criar condições propícias para o desenvolvimento da economia.

EXAME – Em relação ao cenário externo, quais são os maiores riscos para o Brasil? A redução dos estímulos fiscais nos Estados Unidos ou algum eventual contágio provocado por problemas em outros países emergentes?  

Alexandre Tombini – Estamos saindo da crise financeira global e, agora, temos uma perspectiva de melhora nos países avançados, especialmente nos Estados Unidos. A expectativa de crescimento mundial foi revisada para cima, assim como o fluxo de comércio entre os países.

Essa mudança no cenário externo é positiva e beneficia os mercados emergentes. Mas, no período atual de transição, em que estamos em meio a um processo de normalização das condições monetárias e financeiras, há muita volatilidade.

Os preços relativos dos ativos financeiros, como as moedas e as taxas de juro, precisam se ajustar. Faz parte do processo. Não devemos confundir ajuste com fragilidade.

EXAME – É esperado, então, que o real fique mais desvalorizado?

Alexandre Tombini – A desvalorização do real já foi significativa. Não posso prever o que vai ocorrer, o câmbio é flutuante. O fato é que não podemos lutar contra esses ajustes. O que todos os países devem fazer é tomar medidas para passar por esse ambiente de transição. A resposta do Brasil tem sido clássica e robusta.

Começamos a apertar a política monetária, elevando os juros, em abril, antes de o banco central americano indicar que iria reduzir os estímulos. Sobre o câmbio, acumulamos reservas internacionais e podemos usar esse colchão para suavizar os ajustes e diminuir o impacto da desvalorização do real sobre o lado real da economia.

EXAME – A desaceleração da China também tem um papel significativo. Não contamos mais com esse motor para elevar as exportações e o preço das commodities como no passado.

Alexandre Tombini – Fala-se muito em dependência da China, então vale a pena analisar os números: 19% de nossas exportações vão para lá e, hoje, as exportações totais respondem por 11% do PIB brasileiro. Ou seja, as vendas para a China representam cerca de 2% do PIB. Dito isso, é claro que é um mercado que acompanhamos com atenção, também pelo impacto que a China tem para o preço das commodities.

Nossa visão é que a China tem capacidade de sustentar um crescimento econômico razoável nesse processo de transição do modelo, em que o país está deixando de ser só voltado para a indústria e para a exportação e está incentivando o consumo e o setor de serviços.

A China continuará o processo de urbanização, então precisará de commodities metálicas, o que beneficia nossas exportações de minério de ferro. O consumo de proteínas também deverá continuar aumentando. Estamos bem posicionados num horizonte de médio e longo prazo.

EXAME – O maior risco externo, então, é a redução dos estímulos nos Estados Unidos? As mudanças na China ameaçam menos?

Alexandre Tombini – Sim, mas reforço que essa mudança nos Estados Unidos é positiva. Só está ocorrendo porque a economia está se fortalecendo. Se houver dúvidas sobre a recuperação americana, é importante que esse processo de redução de estímulos seja feito com mais cautela.

EXAME – O fato é que a crise nos países emergentes está tirando o sono de muita gente. Segundo o economista Paul Krugman, a bolha nesses países parece estar estourando.

Alexandre Tombini – O Banco Central sempre espera pelo melhor e se prepara para o pior. Hoje, temos condições de não sofrer contágio caso a situação de outros países se agrave. Nossa dívida externa responde por uma pequena parte das reservas internacionais. A dívida de curto prazo é bastante moderada.

Tomamos medidas, nos últimos três anos, para desacelerar a entrada de recursos externos. Era uma preparação para a saída, porque sabíamos que esse fluxo era atípico, tinha prazo de validade. Os países avançados estavam adotando políticas não convencionais na área monetária para tentar sair da crise, e isso injetava uma liquidez extraordinária nos mercados.

Se não tivéssemos atuado para conter esse fluxo, estaríamos sofrendo um impacto maior agora. Também trabalhamos para conter a expansão dos empréstimos no mercado interno. Em 2011, falava-se em bolha do crédito ao consumo.

Recentemente, a inadimplência caiu. Se ainda tivéssemos o crédito crescendo 30%, 40% ao ano, aí, sim, Paul Krugman teria razão em temer pela nossa economia. Mas seguramos nossos excessos.

Fonte: Exame

 

 

 

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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