Dólar e euro estão em falta após alta de IOF no cartão

A alta do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 0,38% para 6,38% nos cartões pré-pago para compras no exterior, anunciada pelo governo no fim do ano passado, provocou uma alta na demanda por moedas em espécie que levou a um desabastecimento de moedas estrangeiras em diversas praças no País, como Salvador, Recife, Manaus, Vitória, Brasília, e Porto Alegre.

O desabastecimento pontual do mercado, que no ano passado foi registrado cerca de três vezes, registrou dez ocorrências somente em janeiro passado, aponta Tulio Ferreira dos Santos, presidente da Associação Brasileira das Corretoras de Câmbio (Abracam).

Paulo Carvalho, operador de câmbio da Fair, em Porto Alegre, resume a situação. “Falta libra há uma semana. Euro temos pouco: tentamos comprar há cinco dias e não conseguimos. O dólar acabou hoje”, conta. “Para nós, a situação é péssima, e para o cliente também”.

Isso porque, conta Carvalho, além de não ter a comodidade de encontrar moedas em agência de câmbio perto de casa, o viajante pode buscar moedas no mercado paralelo ou ter de esperar para comprar, correndo o risco de a cotação aumentar. “O cliente já liga de casa dizendo que falta em moeda em espécie em todo lugar”.

Um hábito do viajante brasileiro, segundo Carvalho, é deixar para fazer a comprar de câmbio em cima da hora, o que torna difícil para as corretoras saber qual o estoque necessário. “Com a alta da demanda, isso piorou”, completa.

Nem mesmo o fim das férias de janeiro, a chamada alta temporada, melhorou a situação. “Já sentimos os reflexos do carnaval. Aqui na região, muita gente leva dólares para o Uruguai no feriado”, conta Carvalho.

Antes do aumento da taxa, a venda de cartões correspondia a 50% do total na corretora. Hoje, não passa de 15%.

Notas são preferência do consumidor

As moedas em espécie lideram a opção dos viajantes, e o objetivo é sempre driblar o imposto. É o caso da administradora de empresas Michelle Ferreira, de 32 anos, que vive em São Paulo. Ela se prepara para viajar para os Estados Unidos. “Já usei o cartão pré-pago e costumava carregar no cartão 50% do orçamento da viagem. Agora pretendo levar tudo em espécie mesmo, por conta do imposto”, conta.

A engenheira Vanessa Barcia, de 45 anos, também de São Paulo, acredita que levar dinheiro no cartão para sua viagem à Europa não vale a pena. “Vou levar bem pouco apenas para pagar valores maiores, como hospedagem, por exemplo”. Para Vanessa, levar moeda em espécie não é sinônimo de inseguro. “Haveria insegurança se eu fosse viajar pelo Brasil”.

A compra antecipada pela internet de passagens de trens, tíquetes para museus, além das passagens aéreas ajudou Vanessa a levar menos dinheiro em espécie e, principalmente, no cartão. “Além disso, é uma viagem para passear, e não comprar”.

Concentração em São Paulo e Rio

São Paulo e Rio de Janeiro são as praças que recebem a maior parte das moedas estrangeiras. Portanto, é mais difícil para o viajante sofrer com o desabastecimento nestas regiões. Mas, quanto maior a distância do centro importador, mais cara a logística.

E se existe maior demanda nos grandes centros, sobra pouco para distribuir aos outros Estados, principalmente os localizados no Sul do País e no Nordeste e no Norte.

Patrícia Marialva da Silva, gerente da Amazônia Câmbio, em Manaus, conta que o desabastecimento de moeda estrangeira na cidade acontecia “dia sim, dia não” até a segunda quinzena de janeiro. A capital do Amazonas já sofria com o desabastecimento de moedas devido à sua distância dos grandes centros. “O cartão ajudava a equilibrar essa falta. Mas agora estas vendas caíram 70%”, conta.

Em Salvador, assim como em Porto Alegre, a situação de desabastecimento é generalizada, conta Raimundo Menezes, gerente da corretora TOV na cidade. “É uma questão de logística. Aqui não tem circulação grande de moedas. Com o crescimento da procura, ficou pior, e fez o volume de negócios cair muito”.

O interior dos Estados, por depender dos grandes centros, também sofre com a falta de moedas. Na corretora Renova do shopping Catuaí, em Londrina, no Paraná, faltam as chamadas moedas exóticas, como o dólar australiano e o peso chileno. “Dependemos de São Paulo. Com o aumento da demanda, o pouco que vem para cá some no mercado”, diz a gerente Ângela Cristina Reis.

A falta de moedas em espécie também pode atingir até mesmo corretoras menores em São Paulo. Uma busca em três estabelecimentos na capital paulista, na região da Bela Vista, foi suficiente para verificar falta de euros em uma delas, a RMP. Segundo o iG apurou, na Confidence e na casa de câmbio do banco Daycoval, ambas na Avenida Paulista, não havia falta de moedas.

Neste cenário, corretoras com mais musculatura, como a Confidence, encontram oportunidades. A Confidence ajudou a suprir a demanda de concorrentes que registraram falta de moedas, conta Fabio Agostinho, diretor de Negócios e Assuntos Corporativos. “Em Porto Alegre, chegamos a ser uma das únicas a oferecer dólar. Acabou nos beneficiando”.

Setor busca conversa com o governo

Diante deste cenário, as corretoras de câmbio aguardam uma conversa como o ministro da Fazenda, Guido Mantega, para verificar como esses problemas podem ser solucionados, ou ao menos minimizados.

Isso porque a demanda maior por moedas em espécie colocou à prova problemas estruturais do setor, aponta Tulio Ferreira dos Santos, presidente da Associação Brasileira das Corretoras de Câmbio (Abracam).

No Brasil, ao contrário de outros países desenvolvidos e até vizinhos, somente é permitido pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) transportar moeda em espécie em aviões cargueiros, por motivos de segurança. “Mas a oferta destes voos não é lá essas coisas, e os aeroportos não têm estrutura. O que já era um problema, piorou agora”, diz Santos.

A maior demanda por moedas em espécie também provoca aumento de custos para os operadores, por conta de necessidade de transportá-las com segurança. “Quando compro a moeda em espécie, desembolso o valor para ter de volta dois ou três dias depois, até chegar na corretora. Com o cartão isso não acontece. É uma operação casada”, diz o executivo.

E para as corretoras que têm mais estrutura, a exposição cambial é limitada a 30% do capital, segundo norma do Banco Central (BC), o que limita ganhos.

Além disso, a importação de moedas está hoje concentrada em bancos menores, o que torna a oferta mais limitada, diz Santos. “Hoje, cinco grandes corretoras também poderiam realizar a operação”. Essa flexibilização já está aprovada por lei desde outubro do ano passado, mas ainda não foi regulamentada.

Procurado pelo iG, o Ministério da Fazenda diz que não comenta eventuais medidas em estudo.

Medida inócua?

Apesar de não citar números, Santos conta que a sensação é de que o consumo do brasileiro no exterior aumentou após a alta do IOF. “Se o governo elevou o IOF pensando em conter o consumo do brasileiro lá fora, a medida foi inócua. O mundo lá fora é mais barato para o brasileiro hoje”, diz.

O volume de compras de brasileiros no exterior é divulgado pelo Banco Central. O dado de janeiro deve ser anunciado no dia 21 de fevereiro.

A expectativa de Santos é de que problemas pontuais de desabastecimento continuem a pcprrer. “Há uma estimativa de que, com o fim das férias, o volume diminua. Mas a busca continua grande. Tem muita gente viajando, principalmente a negócios”.

Luiz Ramos, diretor comercial da rede de franquias Fitta, de casas de câmbio, espera que o consumidor volte, aos poucos, a utilizar o cartão pré-pago. “A alta do imposto assusta, mas o cartão tem benefícios, como segurança, controle de saldo pela internet e trava contra oscilações de câmbio, principalmente para quem viaja para fazer intercâmbio”.

Fonte: iG

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

Menu de Topo