66% das empresas não têm mulher no alto escalão

MULHERES NAS EMPRESAS

Haverá um dia em que diretorias executivas das empresas não serão formadas majoritariamente por homens no Brasil? Sim, haverá, diz Sílvia Fazio, sócia da Chadbourne & Parke LLP e presidente da ONG Will (Women in Leadership in LatinAmerica).

A sua resposta leva em conta a matemática: 18,4% mais mulheres concluem a universidade do que  homens e 59,2% dos formandos em faculdades brasileiras são mulheres, aponta o Inep. Dados também indicam que elas já são a maioria dos formandos em cursos de administração, ciências contábeis e direito.

Mas, se for exclusivamente pela via da qualificação, a mudança será lenta. “Se levarmos em conta apenas estes números vai demorar muito. Contar só com a qualificação não dá. Pesquisas apontam que a igualdade de gênero vai demorar 80 anos. A FGV, por exemplo, fala em 120 anos”, diz Sílvia.

O topo da hierarquia corporativa ainda está longe de ser igualitário e o ritmo evolutivo é lento. Entre 867 companhias de capital aberto no Brasil, analisadas pela FGV, 66,5% não têm uma única mulher na diretoria executiva e quase metade (48%) não têm a presença de executivas em seus conselhos de administração.

Além disso, a participação feminina em conselhos administrativos tem caído: de 2003 para 2012 foi de 9,8% para 7,5%. Em relação às diretorias executivas, uma tímida evolução de 4,2% para 7,7%, segundo dados do Grupo de Pesquisas em Direito e Gênero da FGV.

“Se há evolução pequena nas diretorias executivas, nos conselhos de administração há uma piora. A previsão  de 120 anos para igualdade é para diretoria executiva, porque em conselhos não existe a menor possibilidade de fazer uma projeção”, diz Angela Donaggio, professora da FGV Direito SP. A igualdadede gênero no topo é um mito que não resiste às estatísticas.

A subestimação da qualificação feminina é um fato que prejudica a ascensão da mulher e este não é um problema só do Brasil. “Pesquisas internacionais que analisam perfis de conselheiras e conselheiros de administração de empresas mostram que as executivas têm mais qualificação do que seus pares. Os homens são menos exigidos do que as mulheres para estarem ali”, diz Angela.

O que pode acelerar o processo de igualdade

A sub-representação feminina é uma questão ampla e profunda. Virar o jogo requer transformações sociais. “Não é de fácil solução”, diz Angela. Envolve fatores como a importância da divisão mais igualitária entre pais, ampliação de políticas de licença paternidade, mais oferta de creches, cita a professora da FGV.

Reserva de vagas para mulheres em conselhos de administração e programas voluntários de ascensão profissional feminina nas empresas são exemplos de iniciativas com potencial de encurtar o caminho até a igualdade.

As cotas para mulheres em conselhos de administração já são realidade em países europeus, como França e Espanha, e dão certo. “Mais diversidade de pensamento leva a melhores decisões porque há mais debate, há mais questionamento”, diz Angela.

Experiências internacionais mostraram ainda que havia, sim, número suficiente de executivas qualificadas. “Em todos os países, a demanda foi suprida. Estas mulheres já estavam nas empresas, não surgiram do dia para noite. A questão é que elas eram ignoradas pelo mercado”, diz a professora da FGV.

No Brasil, a adoção ainda é polêmica . “Há mulheres que têm receio de um estigma, têm medo concluírem que ela está lá apenas para preencher a cota”, diz Silvia. Para empresas públicas e de economia mista, tramita um projeto de lei que prevê a reserva de vagas em conselhos de administração Angela, no entanto, vê problemas no projeto .“Não há previsão de órgão de fiscalização nem de cláusulas que garantam a sua execução da lei”, diz .

Outro ponto que ela critica o projeto é a não obrigatoriedade de que a reserva de vagas seja para membros efetivos do conselho. O risco, diz, é que às mulheres sejam reservadas apenas posições de suplência.

“Prefiro as iniciativas voluntárias das empresas, como os programas de ascensão”, diz a presidente da Will. Do estímulo à contratação de mulheres em todos os níveis hierárquicos a ofertas de salas de amamentação, passando por flexibilização de horários e pela possibilidade de home office pais, o programa ideal deve ser amplo, diz.

“Uma atitude de tolerância para retenção de profissionais nesta fase de filhos pequenos resulta na fidelidade do funcionário. Pesquisas mostram que a mulher volta mais engajada e mais produtiva para empresas que mantêm este tipo de política”, diz Silvia.

Mas, na opinião de Angela, há que se ter cuidado para que programas desta natureza não reforcem estereótipos e tenham efeito puramente marqueteiro. “Os programas devem ter um olhar também para os homens que são pais. Do contrário reforçam o pensamento de que o cuidado com os filhos é competência exclusiva da mãe”, diz a professora da FGV.

Fonte: Exame

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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