Por que tantas brasileiras preferem a cesárea, segundo o CFM

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No Brasil, as cesáreas respondem por mais de 55% de todos os partos realizados – quase quatro vezes a taxa (15%) considerada ideal pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Para incentivar os partos natural e normal, o Conselho Federal de Medicina (CFM) editou uma resolução para que a cesariana a pedido da grávida só seja autorizada a partir da 39ª semana de gestação. A medida busca instigar as pacientes a se informar mais sobre os benefícios e malefícios do parto cirúrgico – como medida para aplacar a epidemia de cesáreas.

Para se ter uma ideia, na França, a proporção de cesáreas é de 21%. Em contrapartida, nas maternidades particulares espalhadas pelo Brasil, as cesarianas respondem por cerca de 9 entre cada dez nascimentos.

Segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a cesariana traz riscos desnecessários para a chegada do bebê ao mundo. Quando não há indicação médica, o procedimento pode provocar o nascimento prematuro e aumentar em 120 vezes a probabilidade de problemas respiratórios ao recém-nascido, além de triplicar o risco de morte da mãe.

Segundo Carlos Vital,  presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), o principal motivo para a elevada taxa de partos cesáreos no Brasil está relacionado à falta de informação sobre os procedimentos. Segundo ele, há um déficit também de estrutura: nem todos hospitais estão equipados com uma equipe de obstetrícia 24 horas por dia.

“Esse é um problema que envolve muitos fatores e todos partem da falta de estímulo ao parto natural, tanto por meio da educação em relação às vantagens do parto vaginal, como de uma ampla reestruturação no modelo de assistência obstétrica no país”, afirmou em entrevista a EXAME.com por e-mail.

Médico clínico-geral com pós-graduação em terapia ocupacional, Vital cumpre até 2019 o mandato como presidente do CFM. Veja trechos da entrevista:

EXAME.com: Por que o número de cesáreas é tão elevado no Brasil?

Dr. Carlos Vital: Várias hipóteses podem explicar essa preferência, como medo da dor, a ideia de que a cesariana é mais segura para o bebê e o medo de não conseguir vaga nos hospitais ou de não ser assistida por seu médico obstetra. Todo fatores partem da falta de estímulo ao parto natural, tanto por meio da educação em relação às vantagens do parto vaginal, como de uma ampla reestruturação no modelo de assistência obstétrica no país.

Recentemente, o Conselho Federal de Medicina determinou que a cesariana a pedido da grávida só pode ser realizada a partir da 39ª semana de gestação. Como essa resolução pode mudar a elevada preferência das brasileiras por esse tipo de parto?

O principal objetivo é salvaguardar a saúde do bebê, ao coibir a interrupção da gestação antes da 39ª semana. Com a obrigatoriedade da assinatura da gestante e do obstetra de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), a resolução estimula que os médicos esclareçam amplamente os riscos e benefícios dos tipos de parto. Isso amplia o diálogo e pode vir a mudar a opção da gestante pela cesárea. Mas é importante deixar claro que a resolução não pretende reduzir as taxas de cesariana no país.

O senhor afirmou que o medo da dor é uma das razões para mulheres optarem pela cesárea. Por que isso acontece?

Algumas mulheres relatam que o medo de sentir dor foi o principal fator que as fizeram decidir por uma operação cesariana. No entanto, o acesso à informação pode desfazer esse temor pois, atualmente, já dispomos de uma grande quantidade de métodos para diminuir o desconforto causado pelas contrações, o que pode fazer do trabalho de parto um evento bem mais tranquilo.

O que determina a escolha do tipo de parto pela equipe médica?

O melhor parto depende das condições da gestante e da presença de complicações, pois alguns problemas só podem ser diagnosticados durante o trabalho de parto. Daí a importância de um pré-natal bem feito e de uma assistência médica cuidadosa. Claro que, na ausência de problemas, a via de parto vaginal deve ser estimulada pela menor incidência de complicações como infecção e perda sanguínea, por exemplo.

Fala-se muito da “indústria da cesárea”. O quanto um parto cirúrgico é mais caro do que um parto normal?

O maior problema relacionado às elevadas taxas de cesariana não está relacionado ao custo desse procedimento e sim às condições desfavoráveis para sua realização. Existe, inclusive, uma resolução normativa da ANS que aumenta o valor do parto normal em relação ao cirúrgico. No entanto, é preciso que os hospitais e as operadoras de planos de saúde invistam e ampliem o número de vagas disponíveis para receber as gestantes e os recém-nascidos.

As cesarianas respondem por cerca de 55% dos partos no Brasil. Na rede privada, o índice é de 83%. Por que isso acontece?

Possivelmente, o modelo de assistência no serviço particular falha ao não ofertar um número leitos suficientes. Ao mesmo tempo, algumas operadoras de planos de saúde não disponibilizam equipe médica completa com obstetra, neonatologista e anestesista em regime de plantão 24h. Todos estes aspectos podem influenciar esse contrassenso observado nas taxas de cesariana na rede privada.

Estudo da Fundação Seade aponta que mães com menos de 20 anos, em São Paulo, tendem a evitar o parto normal. O que explica essa relação?

A gravidez na adolescência é um grave problema de saúde pública e está diretamente ligado a uma política ineficaz de planejamento familiar e a uma negligência aos direitos reprodutivos da nossa população. A isso também está associada outra questão: são mulheres muito jovens com  medos e anseios e, muitas vezes, total desconhecimento sobre o próprio corpo e sobre os benefícios do parto normal.

Como outros países combatem a prática da cesariana? Há leis que regulamentam isso?

Na realidade, os países com menores taxas de cesarianas investem em educação e na qualidade de assistência obstétrica. Os países que conseguem manter uma taxa razoável de partos cirúrgicos fazem isto adotando um modelo de atendimento eficaz e com uma boa assistência de pré-natal. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o objetivo da assistência ao parto é manter mulheres e recém-nascidos sadios, com o mínimo de intervenções médicas, buscando garantir a segurança de ambos.

Fonte: Exame

Maurílio Fontes

Proprietário, jornalista, diretor e responsável pelo Portal Alagoinhas Hoje

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